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19 de junho de 2018
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Levanto do banco na milésima tentativa de fotografar o instante que me inspirou a começar a escrever estórias das vidas que passam pelo metrô de Brasília.

Será que passou também aquele instante? Sei que não. Lembro que fica logo depois das margaridas, no sentido Arniqueiras pra estação Central.

No muro que protege os casebres, em contraste com as mansões, todos na margem direita da linha que pego pro trabalho. Mas nunca sei se é antes ou depois da feira. Nunca prestei atenção na feira. Só nas margaridas.

Duas amigas conversam alto sobre a Copa do Mundo, dias de festa, roupas verde-amarelo, pintar as unhas também nas cores da bandeira, e eu percebo que elas estão encostadas na porta, quase encobrindo totalmente a visão do mundo lá fora e, por consequência, das margaridas que podem surgir a qualquer momento e, é claro, do meu tão esperado instante, que não posso perder novamente.

Porque as pessoas insistem em encostar nas portas do vagão, mesmo sob os conselhos constantes da voz esganiçada que tenta alertar, em vão, do perigo?

Não preciso fingir que me importo com regras, mas se elas existem e podem me ajudar nesse momento, seria uma ótima oportunidade. Assim como pensa a imensa maioria dos brasileiros, não é mesmo?

No entanto, não sou eu que vou lembrá-las das regras. Apenas torço, e tento usar o poder da mente, pra que a voz reforce o lembrete e as moças compreendam o recado, ajudadas pelo meu olhar aflito de quem precisa registrar o que está no muro e que deu origem à toda essa desvairada vontade de ler essa gente, meus companheiros diários de viagem.

Sinto que as margaridas estão chegando, e nada da voz ou do poder da mente funcionarem como deveriam. O jeito é correr em direção à próxima porta. Peço licença, desvio de duas bicicletas, driblo um carrinho de bebê, um ambulante, e saio de cara pro gol, livre da conversa sobre a Copa, e já mais perto das margaridas.

Mais que depressa, saco o celular e aponto a lente para o alvo, que também é um protesto contra o preço da passagem e que, invariavelmente, passa despercebido por quem paga pela viagem.

Um grito estampado no muro em cores vivas, logo depois das margaridas, indaga, esperando pela reação de quem só se importa com as cores do esmalte apropriado pros jogos da Copa: 5 contos?

Mas o penta já era... O negócio agora é hexa, Brasil!

Só espero que não no preço da passagem...

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