Em futebol, costuma se dizer que atacante ruim não precisa ser marcado, ele perde a bola sozinho. A analogia futebolística vale para alguns personagens na política brasileira. E o caso que mais se adequa à comparação atualmente é o do empresário potiguar Flávio Rocha, pré-candidato à Presidência da República, cargo que chegou a disputar nos idos tempos de 1994 quando teve de desistir devido a um escândalo envolvendo bônus eleitorais.
Mas, na História o que acontece como Tragédia se repete como farsa e aí chegaremos à analogia com o atacante que não precisa de marcação. Uma vez lançado (ou auto-lançado) pré-candidato à presidente, Flávio atraiu desconfiança e mesmo ódio por parte dos movimentos progressistas, tanto pelo histórico de empresário descumpridor das regras trabalhistas com a sua Riachuelo, como pela postura de "novidade" mesmo sendo useiro e vezeiro de práticas tão velhas quanto a roda. Não tardou que se aliasse ao famigerado MBL, manancial de fake news, e atraísse ainda mais indignação contra si e sua pré-candidatura. Uma indignação que no caso dos progressistas em relação a outro pré-candidato, Jair Bolsonaro, já beira à obsessão, mas, bem, aí é tema para outro texto.
Contudo, a fúria dos movimentos progressistas foi seguida de indiferença completa por parte do eleitorado, progressista ou conservador, que não outorgou ao filho de Nevaldo Rocha mais que 1% em quaisquer pesquisas de intenção de voto realizadas em solo potiguar ou âmbito nacional. Restaria a Flávio - imprensado por outras candidaturas de Centro-Direita, como o já citado Bolsonaro, João Amoedo e Geraldo Alckmin - uma campanha mais agressiva, talvez uma reviravolta radical na comunicação?
O que se viu no espaço de poucos dias foi uma sequência de tiros no pé e situações que parecem saídas de uma comédia sobre assessores trapalhões de um candidato mais trapalhão ainda. Primeiro a divulgação do vídeo na qual, digamos, apoiadores, cantam de forma - nada espontânea - uma canção de letra: "Ai, painho, o presidente vai ser o seu filhinho...". Antes de nos darmos conta da bizarrice da letra, que reforça a ideia de que Flávio é, como sabemos, simplesmente um filhinho de papai (olha a assessoria trapalhada aí, gente) somos brindados com a expressão chocante de desconforto e constrangimento de Nevaldo, um senhor de mais de 80 anos, com a cena. Um vídeo divulgado pela própria equipe do filhinho, perdão, de Flávio, que funciona como uma peça de anti-propaganda.
Dias depois, bizarrice em um tom acima: Sua equipe (serão esquerdistas infiltrados? A se pensar...) divulga uma foto de Flávio sendo carregado nos ombros por um apoiador. Certamente inspirada nas fotos de Lula e políticos populares em cenas parecidas. O problema - crucial neste caso - é que não bastasse a artificialidade da imagem, quem carrega o pesado Flávio nos ombros é um... negro. Em meio a tantos apoiadores brancos, Flávio e sua assessoria acharam por bem, por ato falho, instinto natural ou o que for, colocar um apoiador, provavelmente contratado, de cor preta para sustentá-lo nos ombros. Gerando, assim, imagem didática e referencial sobre como funciona a Riachuelo, o empresariado brasileiro e o país em si ao longo destes séculos.
Da mesma forma que José Agripino sem querer lançou em 2009 a candidatura de Dilma após levar aqueles esporros sobre ditadura em pleno Senado, Flávio sem querer construiu a imagética do que vivemos no país pós-Golpe. Ainda haveremos de agradecer aos seus assessores por isso.
Após os dois fatos, pode-se esperar que Flávio caia de 1% de intenção de voto para zero, vírgula alguma coisa. Não foi necessário a Esquerda se esforçar para desconstruí-lo. Como a bomba de autodestruição política que parecia ser, tratou de fazê-lo por si próprio. E dessa vez não foi com suspeitas de irregularidades. Mas, com trapalhadas dignas de filmes de Mel Brooks.