A esperança do gatinho
Natal, RN 28 de mar 2024

A esperança do gatinho

28 de dezembro de 2017
A esperança do gatinho

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É um dia banal, como qualquer outro, e o que narrarei a seguir confirma, tristemente, a banalidade  de tal fato. Caminho na rua, e escuto um filhote de gato abandonado miando em algum ponto no mato e meus ouvidos, hiper sensíveis a apelos felinos, tem que tomar uma rápida decisão: seguir em frente e ignorar, ou me permitir me sensibilizar? Apesar de ser uma gateira assumida atualmente com 16 gatos sei muito bem que não posso resolver o problema de gatos abandonados  sequer do meu bairro, quiça da cidade ou mesmo do país, mas dessa vez, mais uma vez (não é a primeira vez que recolho gatos na ruas, recupero-os e encaminho para adoção)  a esperança do gatinho foi recompensada, e eu o levei para casa.

So para constatar que seria um trabalho hercúleo salva-lo, visto que o filhote, ainda mui jovem não come solido e precisa ser amamentado na seringa. E é justamente isso que estou fazendo, tentando salva-lo, para encaminhar para uma adoção responsável visto que não pretendo adquirir mais animais eu mesma.

O problema dos animais de rua, não so gatos mas me parece que são os felinos os que estão em maior numero nas ruas, e uma questão socio-ambiental grave, que revela não só o índice de desumanidade da nossa sociedade como também a nossa falta de planejamento urbano eficiente para os desafios civilizacionais desse milênio. Outras sociedades já tem dado o exemplo de relações mais harmoniosas com os animais em ambientes urbanos, de modo que seja possível equilibrar os beneses de sua presença com a minimização dos possíveis malefícios de suas multiplicação.

Qualquer espécie que se dissemine indiscriminadamente pode ser uma praga urbana e ambiental em potencial, mas precisamos sempre lembrar, especialmente no caso dos animais, que isso não é culpa deles enquanto indivíduos, que a responsabilidade é nossa, portanto gostaria de deixar meu repúdio a todo tipo de ação nazista, higienista, que promova massacres de animais de rua como maneira de controle demográfico. Por tras de tal discurso encontra-se sem duvida uma personalidade sádica que, tal como os adeptos dos totalitarismos e ditaduras, se utiliza de maneira cínica do discurso da saúde coletiva, quando visa na verdade satisfazer sádicos desejos autoritários pessoais.

Quais motivações doentias estão por tras de quem, pega cachorros pitbulls para se divertir vendo-os estraçalhar gatos de rua? E isso em pleno campus universitário, lugar que ao invés de dar lição a sociedade de como lidar com o problema, fazendo campanhas de castração, adoção e prevenção do abandono, prefere espalhar placas pelo campus com fotos de gatos e o seguinte dizer: “Não alimente esse problema”. Ou seja, tal como os cartazes nazistas que recomendavam aos alemães não alimentar ou ajudar os judeus de qualquer modo, recomenda-se nessa mensagem que a melhor maneira de resolver o problema do contingente demográfico de felino no campus, e não alimenta-los e esperar que morram.

Outras sociedades lidaram com esse “problema” de outro modo. No Egito Antigo, os  gatos eram deuses, qualquer um que tenha assistido o filme “A múmia” pode lembrar disso. Deveríamos   nos perguntar o porque de um animal que já foi considerado Deus em outra cultura, possa ser hoje muitas vezes reduzido ao conceito de praga urbana.

Os gatos foram animais muito importantes no processo de sedentarização da espécie humana tendo sido, logo depois dos cães, domesticados.  Eles predavam os roedores, insetos em geral e ate mesmo aracnídeos e escorpiões que infestavam celeiros, plantações e habitações humanas desses tempos remotos (por volta de entre 10 e 2 mil anos A.C). ou seja, como os egípcios não tardariam em constatar a ponto de deifica-lo, ter gatos era um método ecológico eficiente para controle populacional de parasitas que atingem os humanos ou seus alimentos de modo a evitar que se tornem pragas.

Durante a Antiguidade, por todo Oriente e mundo mediterrânico, os gatos se popularizaram, tornando-se, gradativamente, os animais preferidos de pessoas que viviam isoladas, eremitas, sábios, magos, de modo que, não por acaso foram profundamente perseguidos e demonizados junto com seus tutores –geralmente sábios que conheciam ervas e métodos alternativos de curas – nas  famosas  perseguições as bruxas  da Idade Media europeia. Dai o tão conhecido e negativo estereótipo da bruxa com seu gato preto que até hoje tanto ódio tem despejado na conta   dos  felinos.

Aqueles que acham que a paisagem urbana ficaria melhor sem gatos, que eles são praga urbana, experimentem tira-los, que além da profunda falta de humanidade que tal gesto revelaria, significaria também que todos aqueles animais predados pelos gatos terão licença livre de reprodução desenfreada, então ai se prepararem para pragas de verdade: baratas, ratos, etc.

Claro que isso não significa que devemos manter animais nas ruas para combater tais pragas, estando os  gatos  no ambiente urbano irão por si so dar sua contribuição, fazendo tais controles nos nossos lares, ao passo que no espaço publico tal controle seria feito por quem deve faze-lo: o poder público em parceria com ongs e contribuição cívica da sociedade consciente, ecologicamente transformada.

Por falar nisso gostaria de elogiar a iniciativa do vereador Sandro Pimentel, do PSOL, que lutou pela conquista dos castramoveis que vem para prestar um relevante serviço à sociedade natalense, devendo realizar castrações de animais de rua, e de pessoas de baixa renda além dos chamados “acumuladores”. O problema é que pela falta de cumprimento da parte que cabe ao executivo municipal, os castramoveis fizeram ate  agora  apenas uma isolada intervenção (apenas uma sessão de castração onde somente gatos machos foram castrados, femeas não devido a maior complexidade do procedimento), configurando toda a demora em promover ações de caráter urgente, que caracterizam desde há muito o governo de Carlos Eduardo Alves em Natal. Como esse homem foi reeleito em primeiro turno prefeito dessa  cidade é algo que como cientista politica e cidadã me escapa a compreensão.

A esperança do gatinho que eu resgatei, e a de todos os outros que estão por ai esperando um resgate, é sensibilizar vocês que agora me leem. Diversos experimentos mundo afora tem produzido o consenso de que criar animais domésticos é algo que contribui para sensibilizar os humanos, literalmente, humanizando-os. Na Alemanha e em alguns países escandinavos chegam a existir estímulos fiscais, tributários, para quem cria animais, pelo entendimento do beneficio civilizacional, que eles representam para uma sociedade. Enquanto que nos E.U.A emergem nos hospitais a terapia  de cura pelo contato felino. Leva-se gatos para serem acarinhandos pelas pessoas em recuperação de cirurgia, quimioterapia e outras doenças e os efeitos tem sido incríveis.

Se você já cria, gatos ou cachorros ou mesmo outros animais, pegue mais um, se você ainda não cria, aproveita o clima de fim de ano pra adquirir um companheiro animal, se presenteie. Só não vale comprar, adote por favor, além de não alimentar um sórdido e sofrível mercado de reprodução compulsória de animais em cativeiro para comercio puro e simples, você estará fazendo o serviço social para a nossa cidade de diminuir o problema de animais abandonados nas ruas e ajudando a manter viva a esperança de vários gatinhos que so desejam um lar e um tutor para os amar.

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