A máfia de toga
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A máfia de toga

22 de março de 2018
A máfia de toga

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Durante muito tempo eu achei que dentre os três poderes, o mais corrompido no Brasil era o Legislativo (se bem que hoje o Executivo está no mesmo nível). No entanto, de alguns anos para cá, venho repensando tal ideia diante deste Judiciário. Temos, apesar de tudo, excelentes parlamentares, pessoas comprometidas com um país democrático, socialmente justo e inclusivo, pessoas éticas, com lindas histórias de ativismo e intervenção social e cultural de relevância para o país. Poderia citar como alguns dos melhores exemplos do que digo Érica Kokay (PT-DF), Maria do Rosário (PT-RS), Fátima Bezerra (PT-RN), Jandira Feghali (PC do B -RJ) ou Jean Willys  (Psol- RJ), dentre outros. Mesmo os corruptos, péssimos parlamentares, com todos seus os privilégios, podem ser cassados em pleno mandato ou perdê-lo ao final de quatro anos com o crivo das urnas (de um ponto de vista ideal, claro, com uma sociedade consciente e politizada que não os reeleja).

Por isso, tal como Lula afirmou ano passado, nesse sentido e somente nesse sentido, a condição do político mais desonesto é mais transparente que a do mais prestigiado membro do nosso Judiciário. Afinal, só no STF temos uma presidente que colocou no LATTES que é doutora, tendo apenas cursado os créditos do Doutorado, mas sem defender a tese, além de Alexandre Morais que incluiu na prestigiada plataforma um Phd nunca cursado, apesar da clareza com a qual a plataforma afirma serem tais condutas crimes de falsidade ideológica. Afinal, o político pode ser removido do seu cargo a quatro anos. Mas e o juiz? O Desembargador? O Procurador? Quem os julgará? Quem os punirá? Uma vez aprovados em concursos e ancorados em carreiras que ocupam, a elite financeira do serviço público do país podem, vitaliciamente, usufruir de privilégios materiais, volto aqui a dizer, dignos de monarquias despóticas do Oriente e da prerrogativa de imunidade absoluta, sobre tudo que fazem e digam por mais danoso, corrompido, e despropositado que seja, do ponto de visto da nação, das civilizações, dos direitos humanos?

O país tem assistido, revoltado, a polêmica em torno do auxílio moradia de juízes, previsto em Constituição quando, no exercício de sua função pública, o magistrado, não dispondo de residência fixa em seu nome no local designado para sua comarca, pode gozar do direito de receber um generoso reforço financeiro em seus vencimentos afim de garantir seu teto. Como sabemos, ser juiz é um das carreiras mais prestigiadas e bem pagas do país, tendo a imensa maioria dos juízes do país, recebido vencimentos acima mesmo do teto constitucional valendo-se de verdadeiras espertezas e interpretações bastante oportunas do que venha a ser o “direito” e a “lei” (que sempre está a favor deles, imagina que coisa ótima, tipo eu sou ruiva, e crio um  concurso de beleza onde eu defino que ser ruiva dá mais direito de participação e inclusão do que ser loira, negra ou morena, por exemplo, só para demonstrar a absurdidade da condição), de modo que volto a perguntar, quem julgará as arbitrariedade eventuais do judiciário? (Não poderia afirmar que todo o Judiciário é corrupto temos belos exemplos de cumprimento da Justiça do ponto de visto mais nobre nesse país, vide a decisão desse mesmo STF sobre os transgêneros há duas semanas).

Até agora, punir um magistrado significa aposentá-lo, ou seja, tira-se seu poder, mas mantém-se seus privilégios, sequer o malfadado auxílio-moradia é cortado. Lembre-se, meu caro leitor, só de auxilio moraria eles ganham mais do que 80% da população do país, e quando cometem crimes que levariam qualquer cidadão comum a terríveis anos de cárcere são aposentados para ganhar 30, 35, 40 mil reais ou mais e viver de férias permanentes, é mole ou quer mais??? Quer mais sim! Querem que a nova LOMAM (Lei Nacional da Magistratura) inclua privilégios tipo, reembolso total de despesas médicas, odontológicas e educacionais dos filhos de juízes no exterior, incluindo carro oficial em qualquer situação social para filhos de juízes até os 28 anos de idade, ou seja, meu caro leitor, o filho de um juiz vai fazer clareamento dental nos E.U.A, onde aproveita para dar uma esticadinha na Disney, e seremos nós a pagar. E quando voltar, tem carro oficial para pegá-lo no aeroporto e tudo. O negócio é ser juiz: tem privilégios, comete crimes, julga a si mesmo, e finaliza dizendo que está tudo bem, está tudo certo, está tudo dentro da “lei”.

Estou ansiosa para ver se terão coragem de manter o criminoso auxílio-moradia à revelia da ira da sociedade, mesmo os de direita, tendo potencial para “unir” o país dividido ao menos desde 2014. Acima de tudo, estou muito ansiosa para saber qual será a postura adotada  pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em relação à desembargadora Marília Castro Neves, responsável por vários crimes puníveis com a prisão, tais como calúnia e difamação da memória da vereadora Marielle Franco; incitação ao ódio e assassinato do deputado federal Jean Willys, e ofensa pautada em preconceito contra a professora potiguar portadora de Síndrome de Down, Débora Seabra, desqualificando sua luta e suas capacidades cognitivas. Volto a dizer, se fossem de pessoas comuns a autoria de tais atos, o que lhes aconteceria?

Temos vistos juízes bêbados dando “carteirada” em policiais que os abordam a partir da lei seca, temos visto juízes que mandam soltar o filho preso em flagrante com mais de 100Kg de maconha, além de armamento pesado e dinheiro vivo, e ainda ameaçando processar todos os que questionaram a lisura da sentença. Temos visto  juiz vir a público defender o auxílio-moradia dizendo que “não é toda hora que juiz pode ir a Miami comprar terno”, portanto precisa de um reforço em seu salário para permitir ao judiciário “mais dignidade no exercício de sua função”. E isso no mesmo país em que um juiz se negou a julgar a ação de um trabalhador rural, (num pais tropical) por que o mesmo trajava sandálias estilo alpercatas que, segundo o magistrado, “não condiziam com a dignidade e decência que pautam as cerimonias do judiciário”.

Temos visto Gilmar Mendes processando a atriz e apresentadora Mônica Iozzi por ela ter exercido seu direito de cidadã de contestar, de maneira perfeitamente racional, uma sentença dele onde o mesmo libertava o conhecido estuprador de mulheres e fugitivo da Justiça, o ex-médico Roger Abdelmassih. Recentemente, a presidente do Supremo disse “ser um absurdo se questionar decisão judicial”. Sério, Ministra Carmem? Vocês querem definir a partir de seus arbítrios, muitas vezes pessoais, o destino de uma nação, e nós sequer podemos questioná-los? Que parte da história da Revolução Francesa a senhora perdeu? Não foi informada na faculdade de Direito que juiz não é Deus? E que faz parte das prerrogativas de um cidadão no Estado Democrático de Direito questionar sim, uma decisão judicial? Só para lembrar, parece que de fato juiz acha que é Deus sim, lembrem do caso icônico da policial de trânsito carioca que teve que fazer vaquinha virtual para pagar uma multa de mais de R$ 30 mil que um juiz lhe impôs quando de sua parada numa blitz da lei seca, ocasião na qual a policial disse que “juiz não é Deus”. O magistrado recorreu aos seus pares, sua turma, sua “máfia” e condenou a policial por calúnia e difamação. Difamação por  ter dito que ele não era realmente um Deus? Veja a que nível chegamos, dizer a um juiz qualquer coisa que seja que ele é menos que um Deus, pode te levar aos tribunais como réu.

Os exemplos são tantos e  tão ordinários que poderia escrever dezenas de páginas sobre  assunto. Quero em nome da objetividade caminhar para minha conclusão de hoje tocando na discussão entre Barroso e Mendes, no STF, quarta-feira (21). Barroso, um dos poucos que creio ter uma conduta de fato ética e idônea naquela corte, se referiu a Gilmar Mendes como uma “mistura de ódio com atraso” e concluiu dizendo que o colega não só envergonha toda a Corte, como “não tem ideia, não tem patriotismo, e está sempre atrás de algum interesse que não o da justiça”.

Não é de hoje que sabemos disso, Ministro Barroso. Não só ele, como outros no STF mesmo estão comprometidos com a “máfia de toga”, Quem não lembra da famosa frase do Senador Romero Jucá à respeito da necessidade do “acordão com STF e tudo” pra “zerar tudo, estancar a sangria da lava jato”, acordão esse do qual Dilma preferiu ser deixada de fora, mesmo às custas da perda do mandato. Nesta quinta-feira (22) será votado o HC preventivo do Lula e essa é minha maior expectativa para consolidar meu entendimento de que o poder Judiciário, e não o legislativo, é que de fato é o poder mais corrupto do Brasil. Se a máfia de toga se consolidar mesmo no Supremo, o argumento se confirma. Se não, sinal que ainda resta esperança de ética e decência nesse Brasil, cada vez mais tão próximo da máxima atribuída a De Gaule de que não seria um “país sério”.

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