Ao mestre, sem mordaça
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Ao mestre, sem mordaça

16 de outubro de 2019
Ao mestre, sem mordaça

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Eu, que sou filho de professora, trago comigo já há algum tempo a educação como uma das pautas que defendo da militância política e na minha atuação parlamentar. Ontem, foi o Dia dos Professores e das Professoras, e eu não poderia deixar essa data passar em branco.

Acredito que, mais do que dar parabéns aos mestres e mestras, essa data é uma homenagem àqueles e àquelas que insistem em acreditar na educação como uma ferramenta muito poderosa para a transformação da realidade, dedicando suas vidas a essa causa. A carreira docente exige muito esforço e estudo dos que escolhem esse caminho, e esses profissionais merecem o devido reconhecimento, simbólico mas também material.

A valorização do fazer docente é fundamental e se dá também através de bons salários. Dessa forma, é preocupante resultado de pesquisa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que aponta o Brasil como um dos países que paga os piores salários aos professores do ensino fundamental ao médio. O piso salarial do magistério é de R$ 2.557,74 para professores em início de carreira, com 40h semanais. Isso é o piso nacional definido pelo MEC, mas ainda descumprido em várias partes do país.

Uma outra pesquisa, de 2013, organizada pela fundação educacional Varkey Gems, levando em conta indicadores como interesse pela profissão, respeito em sala de aula, remuneração e comparação com outras profissões, levou o Brasil a penúltima posição em um ranking com outros 21 países em desenvolvimento. Com alta formação e especialização, professores ainda ganham 25% a menos que profissionais com o mesmo grau de escolaridade em nosso país.

Ouvir os próprios educadores pode indicar o caminho para a mudança estrutural que a carreira docente precisa. Uma pesquisa de 2018, realizada pelo Ibope sob encomenda da Ong Todos Pela Educação, entrevistou 2.160 professores e constatou que quase a metade (49%) não recomendariam a profissão para outra pessoa. É a má remuneração e a falta de reconhecimento social as razões para que os profissionais da educação deem essa resposta.

Quando perguntados sobre o que precisa ser feito para melhorar a carreira, 69% dos entrevistados mencionaram a necessidade de mais oportunidades para qualificação e 67% afirmaram a importância de envolver quem está na ponta, dentro da escola, no processo de escolha e decisão sobre as políticas públicas de educação no país.

Essa última demanda pode parecer óbvia, mas não tem se mostrado verdadeira. Afinal, quem melhor do que os educadores para contribuir na formulação de políticas públicas para a educação? Ao invés de valorização e acolhimento à experiência desses profissionais, o que temos visto é um verdadeiro estímulo à perseguição, numa espécie de caça às bruxas. 

Nossos professores têm sido acusados de doutrinação ideológica de esquerda apenas por cumprirem o seu papel na transmissão de conteúdos programáticos e contribuírem para despertar a construção de um pensamento crítico.

A extrema direita bolsonarista olha para a sala de aula como Dom Quixote olhava moinhos de vento: um inimigo imaginário que está ali pronto para ser desmascarado. Para Cervantes, a luta de Dom Quixote contra moinhos era a metáfora perfeita para a sua loucura. Olhando para os tresloucados membros da despreparada seita bolsonarista, a luta contra os profissionais de educação não pode ser definida como loucura, mas sim como um projeto.

Oportunistas, aprofundam a divisão social hostilizando profissionais da educação em nome de uma fantasia anticomunista. Alienam-se da história e da ciência e, até mesmo, propõem rediscutir a circunferência do planeta. Não tem propostas para os reais desafios da educação pública brasileira, tais como melhorar a qualidade da alimentação escolar, garantir a universalização do ensino integral e o cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação, por exemplo.

Não estão preocupados com isso. Preferem transmissões ao vivo no Facebook, a falsa denúncia em redes sociais e o estímulo à perseguição ideológica. Entre caricaturas e ações concretas, vão tentando castrar o ensino e a emancipação dos sujeitos.

A maior homenagem que podemos fazer aos educadores é dar as condições necessárias para exercerem seu trabalho, sem medo ou ameaças. Esse governo passará, deixando fraturas graves em nossa cultura e educação. Mais do que nunca, precisaremos de professores sem mordaça.

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