A Organização Mundial de Saúde (OMS) alertou em maio para uma crise global de saúde mental em virtude da pandemia da Covid-19. Pânico, impotência, ansiedade, solidão, angústia, incertezas, medos, insônia, irritabilidade, entorpecimento são sinais e sintomas crescentes em milhões de pessoas que estão circundadas pela morte e pela doença nesta pandemia.
Em países como o Brasil soma-se a pandemia um cenário de crises política, econômica e social que agrava ainda mais o sofrimento das pessoas e alguns grupos, em particular. Reconhecer o aumento do número e da gravidade de pessoas em sofrimento mental deveria ser uma ação prioritária dos governos em suas reações frente a pandemia, segundo a OMS.
É neste cenário que surge Bartô, assinatura de um artista do Rio Grande do Norte que atua também no campo da saúde mental. Através da exposição “Diário da Pandemia: a quarentena vista por 40 charges”, o cartunista busca dar vazão para suas afetações com a situação contemporânea e o abalo existencial que ela tem provocado.
Foram 40 charges produzidas entre 9 de maio e 23 de junho, no cumprimento do isolamento social em algum lugar do Brasil. O artista disponibilizou o material para a agência Saiba Mais (leia aqui) e pretende organizar uma exposição física em Natal (RN) após a pandemia.
A identidade do cartunista será preservada a pedido dele:
- “Bartô tem vida própria”, justifica.
Mas quem é Bartô? A resposta é evasiva:
- “Um aprendiz de cartunista depois de velho e do cansaço desse sentimento trágico do mundo. Ou aprendiz do cansaço e velho nesse mundo trágico?”, pergunta.
Independentemente de quem seja, Bartô é a favor do isolamento social e a sua lida com a solidão é o gatilho para que surja, ao longo do percurso das 40 charges, a figura do vira-lata Zé Caramelo, uma espécie de alter-ego e melhor amigo do artista. Bartô se define a partir de uma brincadeira com o Movimento Antropofágico (Modernismo). Segundo ele, é um representante “canideofágico”:
- Pois devorou o ‘complexo de vira-lata’ e regurgitou uma releitura descentralizada do ponto de onde o brasileiro médio se rejeita”, filosofa, antes de soltar uma provocação:
“Ser vira-lata é a subversão da razão de classe-média brasileira”, diz.
Embora lhe faltem certezas absolutas, Bartô não tem dúvidas de que o cenário político brasileiro agrava a tragédia dos tempos atuais. O criador Bartô e a criatura Zé Caramelo analisam o mundo sob a catástrofe do governo Bolsonaro, um líder às avessas que estimula o ódio e menospreza as vítimas da Covid-19.
Na fonte da indignação e da ira de Bartô estão pensadores como Karl Marx e Thomas Hobbes, além de artistas do naipe do belga René Magritte e do londrino Banksy, ícone do grafitti e da arte de rua na Europa. As obras são acompanhadas das notas elaboradas pelo autor, como uma espécie de registro dos acontecimentos que serviram de inspiração, daí o nome da exposição de “Diários da Pandemia”.
Apesar das escassas informações sobre o perfil do autor, ao longo das aventuras de Bartô e Zé Caramelo, os leitores são apresentados durante os cartuns a algumas das características da dupla:
- Bartô, você já avisou para todo mundo que somos antifascistas, né?”, questiona o vira-lata, antes de receber a resposta na lata:
- Óbvio, Zé Caramelo! Não agir contra o fascismo hoje e sempre é ser conivente com uma bestialidade de lesa-humanidade”, devolve.
SERVIÇO
Exposição “Diário da Pandemia: a quarentena vista por 40 charges”
Acesse aqui