Todos se lembram e até virou bordão/meme para a militância de Esquerda o famigerado editorial do Estadão na qual classificava, no título e no texto, como "uma escolha difícil" a opção no segundo turno da eleição presidencial de 2018 entre Bolsonaro e Fernando Haddad.
Nem vou me deter aqui da estupidez e má-fé, em doses proporcionais, do mérito da questão. Em um mundo perfeito não havia qualquer dúvida, independente de opções partidárias-ideológicas entre um professor universitário que havia sido ministro da Educação e um capitão expulso do Exército por insubordinação que defendia fuzilamento de presidente e estupro de mulheres "que mereciam".
Pegarei apenas o ponto de partida para fazer a ilação com a eleição estaduninense, cujo resultado soubemos domingo, a vitória do democrata Joe Biden, ou melhor, a derrota do presidente republicano Donald Trump.
Assim como no Brasil em 2018, também nos EUA agora em 2020 não era "uma escolha difícil". Passei dias debatendo isso com amigos e amigas que sustentam que Biden e Trump "são a mesma coisa". Não. Claro que não são.
Trump, como o sabujo tupiniquim dele, não é de Direita, política e ideologicamente falando. É um dano civilizatório. Machista, misógino, racista, homofóbico, xenófobo, negacionista, e, para piorar o caldo, grosseiro, mentiroso compulsivo e manipulador. Biden tem defeitos, sabemos. Mas, defeitos dentro do jogo político e das complexidades humanas. Como o democrata Bill Clinton tinha defeitos aos montes e o republicano Ronald Reagan, idem. Trump está um passo além, é um desastre como ser humano.
Não compactuo com o argumento do "imperalismo" norte-americano, com que tanta gente querida veio insistir. Esse argumento funciona quando os valores civilizatórios não estão sendo destroçados e nem o fascismo, sutil ou mais vistoso, ganhando força. Eu detestava Reagan e Bush Pai e Filho. Mas, nenhum deles incentivou milícias armadas pelas ruas ou mostrou simpatia com a Ku Klux Klan. Trump, sim.
Enfim, Biden dará prosseguimento à política liberal de sempre e deverá simpatizar com conflitos bélicos, sim, como seus antecessores democratas, além de outras baixezas. Mas, sem o desmonte do processo civilizatório.
Ah, voltando para o raciocínio inicial, quer dizer então que para parte da militância progressista brasileira, não era, claro, uma escolha difícil entre Bolsonaro e Haddad, pelo dano civilizatório que o amigo de miliciano poderia causar (e está causando) e entre Biden e Trump é, sim, escolha difícil porque "são iguais"? Não entendi.
Cartas para a redação.