Bolsonaro e a violência de gênero: que ameaça ele representa às mulheres?
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Bolsonaro e a violência de gênero: que ameaça ele representa às mulheres?

28 de setembro de 2018
Bolsonaro e a violência de gênero: que ameaça ele representa às mulheres?

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Não existem meias palavras para falar de Jair Bolsonaro. As reações agressivas que ele espalha ao longo da carreira política são conhecidas e, muitas, registradas em vídeos e áudios. Quando a candidatura dele à presidência da República ganhou força, o grupo que mais reagiu foi o das mulheres. A pesquisa Ibope publicada no dia 26 de setembro revela que 50% das brasileiras não votam no candidato do PSL de jeito nenhum.

Um grupo de rede social reuniu mais de 3 milhões de manifestantes contrárias às ideias dele. Num contra-ataque, o grupo foi invadido, derrubado e muitas das participantes foram ameaçadas e tiveram seus perfis virtuais deletados.

A advogada Ilka Teodoro trabalha com direitos das mulheres em Brasília e dispara:

- “É uma violência de gênero, sim. É uma forma nova de violência, mas não deixa de ser uma forma de transposição das violências que a gente vivencia cotidianamente. Uma reprodução dessas violências em meio virtual. Acredito sim que seja violência de gênero das mais pesadas”.

Imagem feminista ilustra a capa de grupo de mulheres no Facebook.

Em entrevista para a Agência Saiba Mais, Ilka explicou que, como mulher, defende a necessidade urgente e a importância deste levante feminino contra Bolsonaro e as ideias que ele representa. Por isso pediu a sua equipe de advogados que solicitasse à Procuradoria Geral Eleitoral (PGE) uma investigação profunda sobre quem seriam os responsáveis pelo ataque, para identificar se houve vinculação de qualquer candidatura.

“Uma tentativa de silenciamento é uma agressão, mesmo que virtual”, diz Ilka. Depois do ataque, o grupo foi recuperado pela Polícia Federal e devolvido às fundadoras. O efeito rebote foi imediato: até o fechamento desta reportagem o espaço já contava com 3.749.543 mulheres de todos os estados do Brasil e também de vários outros países.

Elas estão organizadas e preparam um ato de caráter mundial em protesto ao que afirmam que o candidato representa para as mulheres: violência e cerceamento de direitos. E inundaram a internet com a hashtag #elenão. Somente dentro do grupo secreto estão registrados mais de 20 eventos, previstos para acontecer simultaneamente ao redor do mundo. A estimativa é de que milhares de eleitoras saiam às ruas neste final de semana para demonstrar repúdio à candidatura de Bolsonaro.

A violência que ultrapassa a barreira da internet

Ilka Teodoro pediu investigação sobre invasão ao grupo de Mulheres Unidas Contra Bolsonaro, criado no Facebook

Além do ataque virtual, algumas das mulheres responsáveis por criar e gerenciar o grupo contra Bolsonaro também sofreram violência no mundo offline. Algumas foram ameaçadas através de mensagens no celular. E na última segunda-feira, Maria Tuca, uma das moderadoras do grupo, levou socos e coronhadas de três homens ainda não identificados. Eles a esperavam na porta de casa. Bateram, roubaram o celular e fugiram num táxi que os esperava próximo ao local.

Não há nenhum indício ou confirmação de que qualquer um dos ataques tenha sido planejado por partidos ou pessoas ligadas à candidatos. Mas é nítida a associação da violência: uma reação agressiva para quem se levanta contra o Bolsonaro. Coincidência? As mulheres que organizam movimento virtual acreditam que não.

“Esse é o medo que temos. O grupo incomoda, é um retrato da força que podemos ter unidas. Mas o preço que pagamos por lutar é alto, muito alto”, diz uma das participantes do grupo que pediu para não ser identificada. “Toda vez que vejo ele (Jair Bolsonaro) fazer aquele símbolo da arma com a mão, sinto como se a arma estivesse sendo apontada par aminha cabeça, para a cabeça da minha filha”, completa Ilka Teodoro, candidata à deputada distrital pelo PSOL.

Não à toa o movimento #Elenão acontece uma semana antes das eleições. Ilka Teodoro é categórica na conclusão:

- A principal arma que as mulheres têm contra esse ódio e essa discriminação é o voto. É a forma pela qual a gente pode começar a pensar em mudar esse cenário. Votando em mulheres comprometidas com as pautas de direitos das mulheres e as colocando nos espaços de poder e de decisão em todos os cargos. Temos que pensar em representatividade. O voto este ano vai ser fundamental contra esses projetos políticos”.

Sete mandatos por nove partidos diferentes e apenas dois projetos aprovados

Apesar das polêmicas que provoca, Jair Bolsonaro não pode ser acusado de incoerente. A defesa das ideias que o levaram aos holofotes das eleições deste ano está bem registrada em entrevistas, áudios e proposições de projetos de lei desde os primeiros mandatos como deputado federal, em 1991.

Foram sete mandatos, nove partidos. A reportagem da Agência Saiba Mais pesquisou o material disponível nos canais online e, em especial, no Portal da Câmara dos Deputados, para fazer um levantamento da ação do deputado ao longo dos sete mandados legislativos no Congresso.

Além das proposições em que está registrado como relator, Bolsonaro tem 171 projetos de autoria própria. Dois deles – um referente à isenção de IPI para produtos de informática e outro que autoriza o uso da fosfoetanolamina, a chamada “pílula do câncer”, para uso no Brasil mesmo sem aprovação da Anvisa – foram aprovados.

Nos 27 anos de presença legislativa, o agora candidato reforça diversas vezes, em discursos e títulos de proposições de projetos, a intenção em assegurar benefícios para militares, reduzir ou derrubar os direitos das minorias (como no projeto em que pede para que a lei que garante o uso do nome social para travestis seja sustada) e apertar as penas para crimes menores – como furtos, roubos e de trânsito.

Por várias vezes, solicita o porte e a posse de armas. Inclusive, num dos projetos especifica o pedido para que os congressistas possam andar armados dentro da câmara legislativa. Também ressalta repetidamente que não acredita no golpe de 64, sendo autor de uma proposta que pede a “celebração do dia 31 de março de 1964” dentro da casa parlamentar.

Algumas propostas, entretanto, são curiosas. Uma delas “manifesta irrestrito apoio ao direito universal de livre manifestação do pensamento do povo cubano”. Outra sugere a permissão para o uso de palmas após a execução do Hino Nacional em solenidades oficiais. Há, ainda, a que “estabelece o direito de o parlamentar comunicar-se, pessoal e reservadamente, com o cidadão, quando este se achar preso”.

Contradições

Nem tudo é agressivo no rol de projetos do deputado. Há cerca de seis propostas que podem ser consideradas de benefício coletivo – e não restritos a um grupo social específico. Uma delas pede desobrigação em se ter a permissão do cônjuge para a esterilização permanente (a lei brasileira obriga o cidadão ou cidadã a ter permissão do cônjuge para esterilização voluntária).

Por outro lado, todos os projetos que dizem respeito aos direitos sexuais e reprodutivos de mulheres e gays querem a derrubada de garantias. Excluir da lei o direito ao atendimento completo pós abuso sexual ou combater as propostas que tratam do acolhimento social à homossexuais e pessoas trans. Isso sem contar o projeto que questiona o parecer conclusivo da Lei da Palmada, que criminaliza os castigos físicos em crianças e vulneráveis.

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