Controle da pandemia: a situação de Israel e a nossa
Natal, RN 25 de abr 2024

Controle da pandemia: a situação de Israel e a nossa

19 de junho de 2021
Controle da pandemia: a situação de Israel e a nossa

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Em Israel os números sugerem encerramento da pandemia bloqueada pela imunidade. Com 60% da sua população vacinada, fica demonstrado que o número de casos por Covid está sob controle.

Esse controle foi estabelecido, conforme era esperado, pela formação na população de país de um volume de imunizados suficientemente amplo que se tornou capaz de proteger os que ainda não estão imunes. Os resultados disso é que os números se aproximam de zero.

O gráfico abaixo publicado pela Science Table de Ontário, Canadá (clique aqui para ler o artigo original) mostra esse fenômeno que é importante para a humanidade como um todo e comprova a vacina como arma estratégica contra a pandemia.

Figura 1. Casos novos de SARS-CoV-2 e Cobertura vacinal durante a reabertura faseada de Israel

Explicando melhor o gráfico, o que vemos nele é que a linha laranja, que mostra os casos novos declina à medida que avança o percentual de vacinação da população, no gráfico mostrado pelas áreas em violeta (uma dose) e roxo (duas doses).

A boa notícia é que o número de casos cedeu progressivamente à vacinação e não apenas quando foi alcançada a imunidade de rebanho. Porém, se vê claramente no gráfico que, ao ser alcançado determinado patamar de cobertura vacinal, a curva laranja cai praticamente em vertical, sem repiques. Isso sinaliza que naquele momento a imunidade de rebanho foi estabelecida.

É importante assinalar que isso ocorreu com cerca de 50% da população vacinada com duas doses. Porém, sabemos que a imunidade de rebanho na Covid só é alcançada com uma imunização completa em torno de 75% da população. Então o que está acontecendo em Israel? O que ocorreu?

Possíveis explicações e paralelos com a nossa realidade

Entretanto, o gráfico não mostra uma outra variável importante na formação da imunidade de rebanho que é a quantidade de pessoas que se tornaram imunes pela exposição à própria doença.

Hoje no Brasil e também no RN, podemos estimar que cerca de 30% da população já teve contato com o vírus. Uma recente pesquisa em São Paulo constatou isso, porém há um método mais simples de se fazer essa projeção: multiplicando o número de diagnosticados por quatro. Isso ocorre por que, como na maioria dos casos a Covid produz casos leves e assintomáticos, somente cerca de 25% dos pacientes vêm a ser diagnosticados. Esses pacientes são aqueles em quem os sintomas foram suficientemente preocupantes para fazê-los procurar um serviço médico para serem diagnosticados. Os demais ou não tiveram sintomas ou esses foram tão leves que não mereceram suspeição.

O RN com seus quase 290.000 casos confirmados poderia ter, nessa ordem de idéias, quase 1.200.000 pessoas já tendo tido contato com a doença. Num estado que tem 3.500.000 habitantes, vamos nos avizinhando ou ultrapassando essa marca de um terço de potiguares imunizados pela doença, o que confirma o inquérito realizado em São Paulo.

Mas e em Israel? Quantos cidadãos foram confirmados com COVID? Que percentual essa imunidade natural teria na composição geral da imunidade de rebanho?

Essa questão é importante porque ajuda a dar precisão à estimativa que poderíamos fazer para nós de a quantas anda a nossa imunidade de rebanho e quando fará cair a epidemia verticalmente como ocorreu por lá na ocasião em que a vacinação alcançou cerca de 50% da população com duas doses e 60% com duas, como nos mostra o gráfico.

Vale aqui chamar a atenção para o fato de que a primeira dose da vacina Pfizer, utilizada em Israel, já imuniza em três semanas. O que torna a segunda dose importante é que ela dá durabilidade à imunidade que já foi obtida com a primeira dose.

Nessa estimativa, bem imprecisa, temos que considerar que Israel deve ter feito proporcionalmente mais testes para a Covid do que o Brasil e que talvez o fator a multiplicar os casos confirmados para estimar os casos totais, não precise ser quatro, pois poderia ter havido mais testes e mais diagnósticos. Então, apenas para fins dessa estimativa empírica, vamos utilizar três como fator para estimar a imunidade natural em Israel a partir do número total de casos de Covid confirmados.

Esse percentual de imunizados pela doença deverá então ser somado à imunidade vacinal de 50% ou 60% o que nos dará uma idéia mais precisa do percentual efetivamente necessário para a formação da imunidade de rebanho em Israel, o que poderá ser muito útil para nós.

Vamos então a esse dimensionamento. Israel tem cerca de nove milhões de habitantes. O número de casos confirmados segundo o Worldometer é atualmente de 839.747 pessoas. Se multiplicarmos esse número por 3,0 poderíamos estimar que em Israel, para além da vacina pelo menos 2.519.241 pessoas foram imunizadas pela doença,o que representaria 28% da população do país. Isso parece verossímil perante os nossos 30% estimados porque, como sabemos o Brasil vem sendo um dos países mais atingidos pela Covid e a epidemia continua crescendo no país, o que nos fará ganhar ainda mais distância dos números de Israel.

Então qual foi a imunidade de rebanho presumível para frear a epidemia por lá?

Como a vacinação alcançou pelo menos 50% da população com duas doses e mais 10% com uma, e nela estão também os que se imunizaram pela doença, vamos tomar desses 28% apenas a metade, ou seja 14% e suplementarmente mais uns 3% considerando os 60% que tomaram uma dose só, o que resultaria em 17% possíveis.

Não pretendo aqui construir uma verdade científicamente irrepreensível, mas estimar empricamente uma grandeza plausível importante para sabermos onde estamos. É como navegar com um astrolábio. Feita essa ressalva poderíamos estimar que a imunidade de rebanho em Israel foi alcançada com algo que se situa entre 50% + 14% (ou 64%) e 60% + 17% (ou 77%) primeiras e segundas doses somadas nos dois grupos. Esses números (entre 64% e 77%) de imunizados para obtenção da imunidade de rebanho estão no espectro do esperável para a Covid e, nesse sentido, não surpreendem.

E nós onde estamos?

Utilizando, então, o mesmo raciocínio que nos fez chegar no que toca a Israel às grandezas já estabelecidas para a imunidade de Rebanho em Covid, e considerando (a) que o RN tem 12% de vacinados com duas doses e cerca de 30% de vacinados com uma só dose, (b) cque desses vacinados com uma dose, cerca de 50% o foram com a vacina de Oxford,( que também produz imunidade com a primeira dose após três semanas) e levando em consideração (c) que há presumivelmente cerca de 30% de pessoas que foram vítimas da Covid, sobreviveram e estão naturalmente imunizadas em nosso estado, poderíamos estimar que os níveis de imunidade em nossa população seriam os que seguem.

12% (vacinados com duas doses) + 15% (metade dos 30% vacinados com uma dose só e correspondendo à vacina de Oxford) + 22% (correspondendo aos 30% que tiveram a doença e se imunizaram naturalmente, expurgados dos 27% desse grupo que também teriam sido vacinados). Toda esses cálculos, resultariam em “alguma imunidade” presente em cerca de 49% dos potiguares. Eles são imprecisos e devem funcionar como hipóteses, não como verdades firmadas e feita essa ressalva, geram uma estimativa hipotética plausível que nos diz uma verdade importante e cristalina: Não alcançamos imunidade de rebanho entre nós e é importante sedimentar essa sentença.

E a que se deve então o declínio de casos que temos acompanhado nos últimos dias?

Tudo em saúde é multifatorial. Temos que considerar, por exemplo, com uma precisão comparativa entre 2020 e 2021 quase dia por dia, que foi a partir de meados de junho de 2020 que os casos de covid começaram a cair no RN. A isso se soma, obviamente o avanço da vacinação que como vimos em Israel começou a produzir efeitos de declínio no número de casos de Covid antes de ter chegado aos níveis de imunidade de rebanho.

Temos, portanto dois fatores importantes a justificar o declínio que constatamos: (a) elementos sazonais que constatamos repetir-se em 2020 e 2021 e (b) crescimento do número de imunizados pela doença e pelas vacinas, ambos atuando sinergicamente.

Fragilidades e riscos do declínio sem imunidade de rebanho

Com metade da nossa população descoberta de qualquer imunidade a doença continuará sob a forma de epidemia produzindo centenas de casos por dia, internamentos e óbitos. Isso seguirá até que a imunidade de rebanho tenha sido consolidada e ela se situa a uma grandeza de 25 a 35% acima do que temos hoje. Essa grandeza é enorme, pois com mais de um ano de pandemia que nos brindou com centenas de casos novos por dia nós estimamos ter alcançado até aqui 30% da população imunizada pela doença. Do ponto de vista da vacinação, iniciada em fevereiro, temos apenas cerca de 10% de vacinados com duas doses. Alcançar os níveis de imunização presentes hoje em Israel não será tarefa fácil ou rápida.

Ao mesmo tempo a epidemia está viva o que implica em riscos sempre presentes de derrapagem. A variante indiana ou outras que venham a surgir podem ainda nos reservar surpresas.

Portanto, apesar dos números de declínio que vemos no nosso estado serem motivo de justa alegria, eles não devem ainda, sob nenhuma hipótese, recomendar menos rigor nos controles da doença.

O número de leitos ocupados continua acima dos 80% e, se não temos mais fila, o que é a melhor notícia dos últimos dias, a demanda por leitos, também em declínio, continua alta, sendo comparável à de meados de junho de 2020 quando começávamos a descer, sem vacina a curva da primeira onda...

Estamos vendo a luz no fim do túnel, e isso é verdade, alguns países como Israel já cruzaram o limite da volta à normalidade ancorando-a em níveis de imunidade superiores aos da imunidade de rebanho.

Nós não.

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