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22 de abril de 2019
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O domingo no Sri Lanka foi marcado pelo terror. Era Páscoa para os 7% da população católica e muitos deles foram à missa. De forma aparentemente coordenada, oito bombas explodiram em hoteis, igrejas e em um condomínio de três cidades do pequeno país ao sul do continente indiano. O governo prendeu um grupo de pessoas ligadas aos atentados e até agora pouco se divulgou sobre a motivação e a autoria dos atentados. Para evitar a propagação de boatos, notícias falsas e desinformação, o Governo bloqueou as redes sociais.

Whatsapp, Facebook, Instagram, Snapchat, Viber, Facebook Messenger e Youtube deixaram de funcionar em todo o país depois dos ataques. Segundo jornalistas que atuam no país, só era possível se comunicar através do Twitter ou das esquecidas mensagens SMS. A informação foi divulgada pelo site Netblocks, que monitora a liberdade de expressão na internet e também foi confirmada pelo governo singalês.

Não é a primeira vez que os cidadãos do Sri Lanka têm o acesso à rede restrito. Há pouco mais de um ano, em março de 2018, o governo bloqueou o acesso às redes sociais por mais de uma semana para tentar acabar com protestos violentos nas ruas, o que teria provocado uma perda de US$ 30 milhões à economia do país, segundo levantamento do site em parceria com a Internet Society. O que pode ser considerado pouco, perto da grave violação do direito humano à comunicação.

O que nos trouxe até aqui?

Conectar computadores, redes e pessoas e compartilhar conhecimentos com um número cada vez maior de usuários. Estes foram os propósitos de vários projetos de redes surgidos na Europa e Estados Unidos e que serviram de embrião para a rede mundial de computadores (e tablets e celulares e televisores e geladeiras, elevadores, automóveis, ônibus, trens).

A rede foi arquitetada para ser largamente aberta e acessível de qualquer lugar e a partir de qualquer tecnologia. Era preciso compartilhar um protocolo único que garantiria que todos poderiam entrar nesse diálogo. Ensinamos nossos computadores a falarem a mesma língua e criamos espaços abertos, onde qualquer um (que já estivesse conectado) poderia participar. Assim eram as salas do IRC, as páginas da WWW e até as redes de compartilhamento P2P. Até aqui, poucos ganhavam dinheiro com essa tal rede de computadores.

Chegamos ao ano 2000, veio a nova economia, que inflou como uma bolha para logo depois explodir. Mas teve quem se aproveitasse da crise para entender como as coisas ficariam dali pra frente. O Google logo anunciou seus propósitos de “organizar toda a informação disponível no mundo”. A Microsoft preferia tentar ocupar todos os computadores com suas janelas. A Apple queria a mesma coisa, só que com mais design. Até aqui, era possível controlar sua vida digital.

E logo viriam os algorítmos, no Google, no Facebook, Instagram, Whatsapp, Twitter, Youtube. Estamos conectados o tempo inteiro (pelo menos enquanto as baterias não descarregam). Aqui, as companhias já estão ganhando muito dinheiro às custas das informações que cada um de nós faz circular nos espaços cada vez mais fechados das redes sociais.

Ainda assim, o diálogo continua (em plataformas privadas e com cada vez menos privacidade). Cidadãos se conectam ao conhecimento (mesmo que por vias tortas ou canais pagos). A internet funciona, cada vez mais, em plataformas fechadas e com propósitos comerciais e financeiros, mas seus princípios fundamentais ainda estão lá. Cada vez que a rede é bloqueada os fundamentos do diálogo global sofrem fortes abalos.

Quando o Governo do Sri Lanka bloqueia o acesso às redes, ele não cala apenas o terror, a desinformação, a violência. Ele também silencia a voz da esperança, a construção da paz e as informações que podem salvar muitas vidas. Sem falar nas censuras impostas também pelas grandes empresas que controlam a internet e que não zelam pelos princípios fundamentais da rede.

Na revolução industrial inglesa, lá no século 18, operários quebravam as máquinas com medo de que roubassem seus empregos. Mal sabiam que quem roubaria seus empregos eram industriais capitalistas. Bloquear a internet parece o mesmo tipo de solução. Ataca os direitos dos cidadãos, parece resolver momentaneamente a onda de desinformação e terror, mas não acerta o verdadeiro vilão.

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