O jornal noticiou quase como um decreto: "É preciso saber sofrer". É um paradoxo. Mesmo diante de tanta comoção, não sabem sofrer. “Sujeitos sem alma”, dizem os mais radicais. “Não há nesse gramado uma única alma raçuda”. Deram lhes o melhor jogador, os melhores coadjuvantes e caminhões de tradição, mas ainda lhes falta algo.
De repente, nos tornamos medidores de alma e inquisidores de sofrimento. Sofrimento não é coisa que se mede. Isso aqui é só futebol. Mas é que o futebol provoca tantos e tão exaltados ânimos que sofrer é parte do roteiro. É a garantia da recompensa no final, é o que garante o sentimentalismo na TV, é a súplica dos jornais:
“Sofram”!
“Encham seus corações de desespero”!
“Ganham rios de dinheiro, é obrigação ganhar”.
Serão enfim campeões? Se tornou a pergunta dos últimos dias em programas futebolísticos na TV e no Rádio. Nas ruas, o povo reivindica a alma de seus jogadores. A torcida pede que sofram, como ela mesma já tem feito. Mas sofrer não basta. É preciso demonstrar. Como se a vida nascesse em cada jogada incompleta, em cada bola na trave.
A tal alma, demonstração de raça e vontade, apesar de tão característica, desconhece padrões. Habita figuras distintas: dos mais fanfarrões aos mais retraídos. Ainda assim, cabem questionamentos. Medem o amor, o sofrimento, a alma. A vida se tornou uma medição danada. Para o menino que sonha em ser Lionel Messi a vida é mais fácil. Fácil como jogar bola. Isso não mudou. É assim hoje, era assim há 40 anos.
Acreditem ou não, mas a vida pode ser fácil muitas vezes. Embora milhões de almas saibam que dificilmente será. E diante de sua aflição, oferecem o que podem. Há dias de sofrimento e dias de abraço. Lembram que se ganha com técnica, mas também se ganha com alma.
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