Um edital aberto segunda-feira (13) pela BB DTVM, empresa gestora de fundos de investimentos ligada ao Banco do Brasil, chamou a atenção por questionamentos inusitados. Para a seleção de filmes que poderão receber recursos da empresa via Lei do Audiovisual, o formulário de inscrição traz, no campo “informações adicionais”, perguntas que revelam censura prévia da estatal às produções.
“Serão exibidas cenas de nudez ou de sexo explícito?”, “A obra faz referência a crimes, drogas, prostituição?” e “Tem cunho religioso ou político?”. Tais questionamentos fazem parte do formulário de inscrição dos projetos disposto no edital.
Nos anos de 2017 e 2018, nesta mesma oferta de recursos, a BB DTVM não apresentou perguntas dessa natureza.
O diretor do Sindicato dos Bancários de São Paulo e funcionário do Banco do Brasil, João Fukunaga, criticou o edital:
“É um absurdo o governo usar o Banco do Brasil para aplicar esta clara tentativa de censurar, através da força do dinheiro, o cinema brasileiro. Se um filme aborda uma temática relacionada a uma religião diferente da do presidente, não poderá ser realizado? Vários filmes brasileiros com cenas de nudez são premiados internacionalmente. O BB deveria zelar pela pluralidade de ideias e de temas. Vetar que empresas públicas financiem obras cinematográficas devido ao seu conteúdo é uma clara tentativa de censura, a qual o presidente do banco público, Rubem Novaes, corrobora”, disse.
Críticas de Bolsonaro
Na ocasião da transferência do Conselho Superior de Cinema para a Casa Civil, em 18 de julho, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que não pode “admitir filmes como Bruna Surfistinha com dinheiro público”. O representante da extrema-direita no Executivo chegou a deixar clara sua intenção de aplicar “filtros” na produção cinematográfica brasileira – inclusive garantindo que haverá cerceamento de obras que não sejam condizentes com a "moral judaico-cristã".
“Nós não queremos nem censuraremos ninguém, mas não admitiremos que a Ancine faça peças ditas culturais que vão contra os interesses e nossa tradição judaico-cristã”, afirmou.
O sindicalista que fez a denúncia destacou que a Constituição Federal prevê que o Estado é
“Além de atentar contra o estado laico, a postura do governo e da direção do banco é extremamente equivocada, uma vez que não é doação para a produção, mas sim um investimento que traz retornos financeiros. É também uma forma de fomentar a indústria cinematográfica e de preservar o patrimônio cultural do nosso país”, completou Fukunaga.
Histórico de censura
Em abril, Jair Bolsonaro ordenou pessoalmente que o Banco do Brasil retirasse do ar uma campanha publicitária estrelada por atores e atrizes negros e jovens tatuados usando anéis, dreadlocks e cabelos compridos.
O episódio culminou na queda do diretor de Comunicação e Marketing do Banco, Delano Valentim, funcionário de carreira, que deixou o cargo.