Menos de 48 horas depois do decreto que protegia os movimentos sociais das ações truculentas da Polícia Militar nas reintegrações de posse no Rio Grande do Norte, a governadora Fátima Bezerra (PT) recuou e revogou parte das determinações.
O decreto editado na quinta-feira (8) obrigava a PM à informar detalhes sobre o cumprimento das ações à governadora, ao secretário de segurança Pública, ao procurador geral, independente do Estado ser réu na ação, e ao comitê estadual de resolução de conflitos fundiários rurais.
O documento também previa que as operações ocorreriam somente após a autorização do secretário de Segurança Pública.
Com o novo decreto, publicado neste sábado (10), apenas o titular da Segurança precisa ser informado sobre as ações.
Está mantido, no entanto, o artigo que determina que as operações de reintegração de posse deverão seguir o protocolo previsto pelo Conselho Nacional dos Direitos Humanos. É um ponto positivo.
Ao exigir informações prévias sobre as reintegrações de posse, Fátima só usou o poder que lhe garante as constituições federal e estadual: a de chefe das forças de Segurança do Estado.
O decreto, na verdade, era desnecessário, senão para reafirmar de quem é a voz de comando na área.
A revogação de artigos importantes do documento expõe os movimentos populares e empodera setores da Polícia Militar que adotam o discurso e a prática de criminalização desses movimentos, em especial o MST, alvo do ódio de grupelhos da PM, da imprensa antipetista e de uma parcela considerável da classe média brasileira.
Outro detalhe é que o novo decreto deixa praticamente sem função o comitê de conflitos agrários, criado em junho exatamente para mediar situações de tensão diante das iminentes ações de reintegração.
Nunca é demais lembrar que a ideia de um comitê específico para tratar do tema surgiu após a PM atacar um acampamento do MST na região rural de São Gonçalo do Amarante. Já o polêmico decreto foi editado após nova ação truculenta da polícia, semana passada, que não passou pelo comitê. Nos dois casos a governadora não foi informada das ações.
A responsabilidade de informar à governadora sobre as operações é do comandante da PM, coronel Alarico Azevedo. Nos bastidores ele foi um dos que mais reagiu às novas regras.
O Governo tem comemorado com cautela a redução do número de mortes violentas no Estado. Os dados devolvem o Rio Grande do Norte a um patamar anterior a 2015.
Fátima investiu no pagamento de diárias operacionais, colocou mais policiais nas ruas e as polícias – civil, militar e técnica - passaram a trabalhar de forma mais interligada.
Por outro lado, dois índices chamam a atenção: o aumento de feminicídios e da violência policial, se comparado com anos anteriores.
É sabido que a gestão petista enfrentaria reações de setores da PM, especialmente da ala bolsonarista. A Segurança é o setor mais delicado do Governo e, pelo menos até agora, o que melhor tem respondido nos primeiros meses da administração petista.
Do primeiro governo popular de um Estado historicamente administrado por famílias que se refestelaram no poder, se esperam decisões e ações voltadas para corrigir distorções, desigualdades e preconceitos.
A Polícia Militar e ostensiva não é um setor paralelo do Estado.
Por hierarquia, independente de decreto, a governadora tem que saber o que faz a polícia subordinada à ela.
Sob pena de perder o comando.