MPT vai recorrer de decisão que livrou Guararapes de indenização milionária
A procuradoria geral do Trabalho anunciou nesta segunda-feira (29) que vai recorrer da decisão do juiz da 7ª Vara do Trabalho Alexandre Érico da Silva que condenou a Guararapes Confecções S/A por terceirizar o trabalho das facções de costura no interior do Rio Grande do Norte, através do programa Pro-Sertão, mas livrou a empresa da indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 37,7 milhões pedido pelo Ministério Público.
O MPT vai insistir na tese do dano moral coletivo e manter o pedido da indenização milionária. Como a primeira decisão foi monocrática, na segunda instância quem julga é o pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região, com sede em Natal (RN).
Na avaliação do procurador do MPT Márcio Amazonas, a sentença mostrou que o Judiciário concordou com os argumentos da tese defendida pela acusação, mas discordou da punição, desconsiderando o dano moral coletivo sofrido pelos trabalhadores explorados:
- Não posso dizer que o juiz discordou da tese ministerial. Ele concordou com nossos argumentos, mas não com os pedidos. Você pode ver na decisão que o juiz gasta quase metade da parte do mérito destacando ponto a ponto as afirmações do Ministério Público do Trabalho que ele concordou”, disse.
A decisão do juiz Alexandre Érico da Silva confirma a principal tese do MPT relacionada ao modelo terceirizado de contratação das facções de costura pela Guararapes. O juiz concorda que a empresa detinha o controle operacional das fábricas de costura, como consta num trecho da sentença:
- Em resumo, o que temos pintado nesse quadro é uma imagem nítida de uma terceirização mitigada onde as facções contratadas prestam um serviço predefinido, engessadas pelas imposições da demandada Guararapes sob o argumento de necessidade de manter padrões de qualidade, sendo esta última a real beneficiária de toda cadeira produtiva com seus lucros e dividendos”, escreveu o magistrado.
Márcio Amazonas destaca, na decisão, que o magistrado também confirmou, como defendida o MPT, que a finalidade do programa Pro-Sertão vem beneficiando uma gigante do ramo têxtil em detrimento dos trabalhadores:
- O juiz concordou que esse sistema de financiamento estatal via pro-Sertão está beneficiando somente uma gigante do processo têxtil. Claro que ele foi menos duro na punição do que a gente esperava. Imaginávamos, pelos fatos narrados e que o que magistrado confirma, uma reprimenda um pouco maior. Por isso, respeitosamente, vamos recorrer para que essa decisão seja modificada.
O procurador voltou a insistir que o dano moral coletivo precisa ser reconhecido como forma de punir a empresa pelo ilícito que o próprio Judiciário já se convenceu de que a empresa cometeu:
- Houve dano moral coletivo sem que nenhuma providência fosse tomada contra a empresa. Todo ilícito cometido tem que ser punido. E tem que punir para que o ilícito não seja cometido novamente.
Processo
A ação do MPT pedia que a Justiça reconhecesse o vínculo de emprego entre a Guararapes e os trabalhadores atuais e os futuros contratados pelas facções de costura de vestuário. Além disso, os procuradores exigiam a adoção pela empresa de medidas legais de proteção ao meio ambiente de trabalho em todos os estabelecimentos de facções.
Os procuradores do Trabalho pediam também que, caso não fosse reconhecido o vínculo, que a empresa fosse responsabilizada solidariamente pelo cumprimento de todos os direitos e encargos sociais decorrentes dos contratos de emprego firmados pelas facções, em face da configuração de grupo econômico.
A Guararapes alegou na defesa falta de legitimidade do MP para fazer a denúncia, evocou aplicação da nova lei de terceirização aprovada no governo Temer e pediu a anulação do processo também por ausência da formação de litisconsórcio passivo necessário.
Decisão confirma que Pro-sertão foi criado para beneficiar Guararapes
Existem 61 facções de costura em atividade no Rio Grande do Norte cadastradas no Pro-Sertão, programa criado em 2013 pelo governo Rosalba Ciarlini que prometia revolucionar o sertão potiguar, mas que se mostrou mais um modelo de exploração de mão de obras barata no Estado para obtenção de lucro sem retorno para a sociedade, conforme consta na decisão do juiz:
“Efetivamente, a demandada (Guararapes) adotou como estratégia de redução de custos a via da terceirização de sua atividade-fim, isso atrelado a benefícios fiscais concedidos pela Sudene e Governo do Estado do RN, fato confirmado em depoimento do seu preposto e documento ID c1f89ce. Essa prática demonstra que o dinheiro público foi usado em benefício da empresa sem que esta efetivamente tenha se preocupado em dar a sociedade uma resposta positiva, mantendo seus postos de trabalho diretos, e procurando diminuir seus custos de outras maneiras que não driblar a legislação laboral travestida de adesão ao “Pró Sertão”, disse.
Repercussão
O caso ganhou repercussão nacional em 2017 em razão do montante reivindicado a título de danos morais coletivos e também pela reação do empresário Flávio Rocha, dono do grupo Riachuelo/Guararapes, que acusou o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Norte de perseguição.
Rocha foi condenado por injúria na Justiça Federal, em julho de 2018, após ofender publicamente a procuradora do Trabalho Ileana Neiva Mousinho, única mulher a integrar, ao lado de outros 10 procuradores, a equipe da força-tarefa responsável pela investigação das condições de trabalho nas facções de costura no interior do Rio Grande do Norte.