Mudança no CadÚnico sugerida pelo Governo Federal vai dificultar acesso de famílias a benefícios sociais
Natal, RN 23 de abr 2024

Mudança no CadÚnico sugerida pelo Governo Federal vai dificultar acesso de famílias a benefícios sociais

10 de fevereiro de 2021
Mudança no CadÚnico sugerida pelo Governo Federal vai dificultar acesso de famílias a benefícios sociais

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O Governo Federal quer substituir a realização do Castro Único nos Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) e outas instituições municipais, por um aplicativo de celular. Ainda não há um prazo para que a mudança seja implantada, mas ela já preocupa os gestores pela possível falta de acesso dos beneficiários à efetivação do cadastro e pela possibilidade da perda dos dados já cadastrados e utilizados nas políticas de assistência social dos estados e municípios em todo o país, salvos no CadÚnico. O Fórum Nacional de Secretários/as de Estado de Assistência Social (Fonseas) emitiu uma nota pública criticando a mudança.

O Cadastro Único é hoje o maior banco de dados que existe no país e no mundo sobre a situação das famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza. Na América Latina, não se tem notícia de um banco de informações tão amplo sobre a situação de vida e condições de pobreza da população vulnerável como o nosso. Além disso, há uma grande fragilidade em deixar que uma pessoa faça o cadastro sozinha. As unidades de Cadastro Único existentes em cada município estão preparadas e treinadas com pessoal habilitado para acolher essas pessoas que procuram o CadÚnico e não só para ingresso no Bolsa Família. Ele é uma porta de entrada para acesso a outras políticas públicas, porque ao entrar num atendimento, se abre para um campo de possibilidades. As pessoas que estão ali, estão lá não só para preencher um formulário, mas para acolher as necessidades e encaminhar essa pessoa para a rede de atendimento sócio assistencial, identificar as carências, os problema e violações de direito. Quando o Governo Federal decide substituir esse atendimento concreto por um aplicativo, deixa de dar visibilidade a essas políticas públicas. Uma pessoa semianalfabeta, com pouco letramento e em uma comunidade rural, vai conseguir usar esse aplicativo?”, questiona Iris de Oliveira, titular da Secretaria de Estado do Trabalho, Habitação e Assistência Social (Sethas) e vice-presidente do Fórum Nacional de Secretários/as de Estado de Assistência Social (Fonseas).

Uma das justificativas do Governo Federal para a troca do atendimento presencial por um aplicativo de celular, é evitar a ocorrência de fraudes.

“Muito pelo contrário, o auxílio emergencial se mostrou muito vulnerável à fraude e isso foi divulgado por toda a imprensa. Esse argumento não se justifica. Quem não tem acesso ao aparelho celular vai ficar numa situação complicada, sem acesso ao cadastro”, critica Iris.

A secretária da Sethas também cita como exemplo de necessidade do atendimento presencial o caso recente do mesmo Auxílio Emergencial quando, em muitos municípios, foram os funcionários das prefeituras e assistentes sociais que compraram chips de telefonia celular para que as pessoas conseguissem se cadastrar e ter acesso ao benefício.

“É essa a realidade que temos nos municípios! Nem todo mundo tem acesso a celular, treinamento e condições de preencher um formulário. Além disso, com o aplicativo se passa a adotar práticas vexatórias para comprovação da situação de pobreza. Essas mudanças são muito preocupante porque, se realmente efetivadas, vão significar não só uma perda de um banco de dados com muita qualidade para os gestores públicos, como também uma maior negação de direitos e políticas públicas a essa população que mais precisa”, avalia Iris de Oliveira.

Outro ponto que preocupa o Fórum Nacional de Secretários/as de Estado de Assistência Social é que a mudança foi sugerida sem qualquer diálogo e durante uma das maiores crises da história, quando a população mais precisa da proteção do estado. Além do Auxílio Emergencial e do Bolsa Família, o CadÚnico também é utilizado para definição do público alvo de programas criados pelos estados e municípios. Aqui no Rio Grande do Norte, por exemplo, a base de dados do Cadastro Único é usada para definir quais famílias serão atendidas pelo Programa do Leite Potiguar e o Pró-Moradia.

Perda de repasses para municípios

Além da dificuldade de acesso ao cadastro, do maior risco de fraude e da perda do banco de dados, o fim do atendimento presencial para realização do CadÚnico pode representar, também, perda financeira para os municípios.

“Hoje, para cadastrar famílias em situação de pobreza que estão em localidades distantes, como as quilombolas, o município monta uma pequena estrutura no local e faz busca ativa para cadastrar as famílias. Na proporção em que esse trabalho deixa de acontecer, também vai ter o desemprego dessas pessoas que atuam na assistência social e os municípios vão deixar de receber incentivos e recursos dentro do cofinanciamento da assistência social para funcionamento do Cadastro Único”, denuncia Iris de Oliveira, vice-presidente do Fonseas.

Instituições como a Federação dos Municípios, a Confederação Nacional dos Municípios, além do próprio Fonseas e secretários estaduais e municipais da assistência social se posicionaram contra a mudança, que sequer foi comunicada aos gestores. A expectativa é que seja aberto um diálogo com o Governo Federal para discutir a questão até o dia 24 de fevereiro, quando deve acontecer nova reunião da Comissão Intergestores Tripartite-CIT.

Pessoas no CadÚnico

Em todo o país, o número de pessoas registradas no Cadastro Único passou de 80.954.053 em 2015 para 77.065.860 em 2020, o que demonstra uma queda na inserção das famílias no CadÚnico a partir no ano em que foi autorizado o impeachment da presidente Dilma Rousseff. O Nordeste é responsável por 54,7% das pessoas cadastradas em todo país. No Rio Grande do Norte 49,4% da população está cadastrada.

Famílias beneficiárias do Bolsa Família no RN

2018: 350.172
2019: 351.058
2020:356.293

Valor médio do benefício no RN

2018: R$ 180,78
2019: R$ 187,13
2020: R$ 59,04 (aqui houve transição de beneficiários do Bolsa Família para o Auxílio Emergencial)

Valor repassado para o RN pelo Bolsa Família

2018: R$ 63.315.490,58
2019: R$ 65.711.825,92
2020: R$ 20.073.444,73 (transição de beneficiários do Bolsa Família para o Auxílio Emergencial)

Fonte: Sethas
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