O churrasco que foi sem nunca ter sido
Natal, RN 24 de abr 2024

O churrasco que foi sem nunca ter sido

11 de maio de 2020
O churrasco que foi sem nunca ter sido

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Entre as trações do circo de horrores que atende pelo nome de Governo Bolsonaro, fomos impactados com a notícia, dada pelo próprio presidente em alto e bom som e em público, na quinta-feira passada, que ele faria um churrasco "para umas trinta pessoas", no Planalto, no fim de semana. Sim, em meio a uma pandemia e quando o Brasil contava 10 mil mortos pelo Covid-19 o presidente faria um alegre churras para comemorar sabe-se lá o quê.

No sábado, coerente com a esquizofrenia e sequência de recuos dele, não apenas disse que não haveria churrasco algum como que fora notícia fake da imprensa, de "jornalistas idiotas", mesmo com a declaração sendo em um microfone em público e tendo sido gravada.

No mesmo sábado, churrasco dele não houve, mas... tirou parte do dia para passear de jet ski no lago Paranoá e comer um churrasco que amigos e apoiadores fizeram em um iate próximo, à guisa de provocação, claro. Falando em provocação, apoiadores diversos fizeram nos jardins das imediações do Planalto vários churrascos, desrespeitando o isolamento social, certamente em desagravo, digamos, ao presidente.

Ou seja, não houve churrasco. Mas, houve. Enfim, a coisa toda, apesar de simples, é complexa. Mais que isso: o episódio do churrasco mostrou aspectos diversos bem didáticos que mostram possíveis e concretos desgastes para o despresidente.

Primeiro, porque apesar das dezenas de abilolados churrascando nos jardins, a verdade é que desde a posse foi o primeiro caso envolvendo um conflito de Bolsonaro que seus apoiadores não conseguiram "subir" uma hastag de apoio no Twitter. Pode parecer bobagem, mas não é. O bolsonarismo sobrevive desta penetração nas redes sociais, principalmente no Twitter, mais dinâmico e com efeitos práticos.

De fato, que hastag eles poderiam levantar? #ChurrascoSim? #ChurrascodaMorte? (este, foi usado pelos críticos) #QueroChurrasco? Como defender, independente de espectro político, a realização por um chefe de estado de uma festa (o churrasco) em meio a uma pandemia com o país batendo recorde de mortos dia a dia?

Vamos ao segundo ponto: O "caso do churrasco" conseguiu gerar deserções entre os bolsonaristas. Percebeu-se que um certo número de pessoas que até então, ainda que com ressalvas, apoiava o "mito", debandou após a postura leviana. Porque esse pessoal não enxergou política no fato, mas, sim, percebeu o descaso de Bolsonaro para com a doença e as mortes que vem se somando. Uma coisa é "combater e corrupção e lutar contra os comunistas que querem transformar o Brasil numa Venezuela", outra é mostrar indiferença com quem morre ou adoece. Lembremos que entre os bolsonaristas, muitos estão vendo amigos, conhecidos e parentes internados ou irem a óbito, o que os faz perceber que não se trata de Direita x Esquerda, mas de luta contra uma doença desconhecida e sem cura.

Portanto, o churrasco não aconteceu, mas, é como se tivesse acontecido. Pode-se resgatar o ditado popular e dizer que neste caso, valeu a intenção. Para o bem e para o mal. Aliás, corrigindo este outro ditado, para o mal, pois não houve lado positivo para o bolsonarismo neste episódio.

E o título deste texto faz menção, claro, à Viúva Porcina, "a que foi, sem nunca ter sido", personagem criada por Dias Gomes para a novela "O Bem amado", que na versão que foi ao ar em 1986, teve como protagonista, a atriz Regina Duarte, secretária de Cultura que protagonizou episódio deprimente esta semana em entrevista a CNN, onde debochou dos assassinados e torturados pela Ditadura Militar. Em um episódio também sem nenhum ganho político ou dividendo para o Governo.

Um governo, por sinal, que é, sem nunca ter sido.

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