O papel da Memória no direito à Verdade
Natal, RN 23 de abr 2024

O papel da Memória no direito à Verdade

31 de março de 2019
O papel da Memória no direito à Verdade

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Marejado pela dor das feridas não tratadas, o dia inicia com a expressão da indignação ao chamado oficial do presidente da República às comemorações do golpe de 1964.

O dever de se efetivar o estado de Direito, a partir de um resgate da história, da reparação aos danos impostos pelo Estado aos perseguidos políticos brasileiros, do restabelecimento pleno do preceito da justiça e da reforma das instituições para a Democracia, dar lugar a um anúncio confeccionado nas profundezas do autoritarismo e em confronto à luz dos princípios da Constituição Democrática.

Mas mesmo nublado, o dia se levanta para dizer que não aceita que alguém se utilize formalmente de um cargo para afrontar a história política de tantos e tantas brasileiras que deram suas vidas pela liberdade. Para dizer que é inaceitável que, no Brasil, as atrocidades cometidas contra a pessoa humana durante a vigência dos regimes autoritários ainda representem uma ameaça ao futuro de liberdade, democracia e de respeito ao valor máximo da dignidade da pessoa humana.

Sob o conceito de que é preciso lembrar para não repetir jamais, a política de preservação da memória histórica e de afirmação permanente dos valores democráticos é um imperativo à projeção do Estado de Direito.

Este ano, quando se completam cinco décadas e meia do golpe militar que instituiu um regime ditatorial, cerceador, autoritário e violento no País, faz-se necessário reivindicar a memória da democracia que não vivemos, da democracia que pudemos construir e da democracia que queremos alcançar.

Não se trata apenas de conhecer o passado, mas de compreender a história contemporânea do Brasil, de entender o presente e de ser capaz de pensar o futuro à luz da Verdade.

Resgatar as verdades ainda desconhecidas ou pouco divulgadas a respeito das violações de direitos humanos praticadas pela ditadura de 1964 é também uma forma dese imbuir da relevância da manutenção da justiça e das liberdades públicas.

Para seguir adiante, é preciso superar a política brasileira centrada no silêncio e a descomprometida leitura de que a anistia deve ser vista e convertida em amnésia, como tentativa de se impor o esquecimento.

A política da impunidade preterida pelo regime ditatorial com a aprovação de uma anistia restrita já não encontra mais espaço no presente democrático. A busca por restabelecer a verdade negada ou não conhecida se torna, assim, uma maneira de transformar um período marcado pelo autoritarismo em um caleidoscópio de novas formas de exercício de direitos.

A tipologia de crimes contra humanidade surge como uma nova síntese jurídica civilizatória e universal em torno dos direitos humanos. Réu atualmente na Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA em razão dos desaparecimentos no Araguaia, o Brasil não tem nada acomemorar.

Encarnadas por caudilhos carismáticos, a ditadura de cunho militar institucionalizada em 31 de março de 1964deixou ao Brasil um legado atroz de assassinatos, desaparecimentos forçados e diversas formas de tortura.

Em duas décadas, pelo menos 377 pessoas foram responsáveis, diretas ou indiretas, pela prática de assassinatos de 434 opositores ao regime. Entre 30 mil e 50 mil pessoas foram presas e torturadas. Um média de 536 sindicatos sofreram intervenções. Sem contabilizar os assassinatos políticos, ainda não elucidados, cometidos após o período de abertura democrática no país, a exemplo do emblemático caso da morte do potiguar, dirigente comunista e ex-guerrilheiro do Araguaia, Glênio, ocorrido em 1990.

Os desafios e deveres que as sociedades que emergem do autoritarismo ou da violência armada enfrentam não são, somente, tarefas ao esclarecimento e ao reconhecimento coletivo e crítico dos fatos do passado e à criação de condições para uma paz sustentável; são, também, e, centralmente, o cumprimento da dívida de justiça com quem no passado foi vítima de violações de direitos humanos e outras formas pelas quais seus direitos fundamentais foram afetados pela ação do Estado.

O regime do medo que sustentava o passado não pode servir de desculpa no presente democrático. É preciso abraçar a luta contra a impunidade e levar a consolidação da democracia para ouro nível de eficácia.

Memória e Verdade conjugam-se em termos de justiça para afirmarmos sonoramente: Ditadura Nunca Mais!

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