O que é ruim para o país é bom para o governo Bolsonaro
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O que é ruim para o país é bom para o governo Bolsonaro

20 de setembro de 2021
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Estas linhas vêm no calor do centenário do mestre Paulo Freire e das belas homenagens que, merecidamente, vem recebendo no Brasil e no mundo. Ao mesmo tempo, na semana anterior ao aniversário de Freire, duas falas do presidente da república (sim, com iniciais minúsculas mesmo), com intervalo de dois dias de uma para outra são extremamente simbólicas sobre o projeto de nação desse governo: “Fake News faz (sic!) parte da vida” e “o excesso de professor atrapalha o país”.

Enquanto faz tais afirmativas, o próprio presidente, seus filhos e seus seguidores não cansam de atacar o legado e a memória de Paulo Freire. E, muito provavelmente, sem lerem uma linha de seus escritos. E ignorando o fato de que, oficialmente, as teorias de Paulo Freire nunca foram adotadas no sistema público de ensino brasileiro.

Ao dizer que o Estado foi inchado com as contratações do governo Dilma, o presidente mais uma vez faz o que sabe bem: dispara uma fake news. Interessante que o INEP, órgão do próprio governo, apontou, num estudo em 2003, ano em que o Presidente Lula tomou posse, que havia “déficit de docentes nas turmas de 5ª a 8ª séries e ensino médio, principalmente nas disciplinas de Física e Química”. Diz a matéria do INEP:

De acordo com o estudo, para atender a demanda atual, são necessários 235 mil professores no ensino médio e 476 mil nas turmas de 5ª a 8ª série, totalizando 711 mil docentes. Mas nos últimos anos se formaram 457 mil nos cursos de licenciatura. Esse número não atende sequer a demanda do segundo ciclo do ensino fundamental, e o déficit chega a 254 mil professores.

Podemos dar um salto para 2019 e teremos mais um dado interessante sobre o tema, do próprio INEP: “40% dos professores que atuam no ensino médio não têm formação adequada nas disciplinas que lecionam”. Ou seja: estão ocupando as vagas de magistério aqueles sem formação para tal, por uma causa óbvia: as licenciaturas existentes não estão dando conta da demanda, principalmente nas áreas de Ciências da Natureza e Matemática.

Então, mesmo com os avanços educacionais dos governos Lula e Dilma, incluindo concurso para professores, implementação do FUNDEB, piso salarial nacional de professores, expansão com interiorização da Rede Federal de Educação Profissional (os IFs), não se conseguiu sanar o déficit com professores e sua formação, tamanho o fosso do descaso com a educação no país. No governo Bolsonaro, esse quadro piora com tantos cortes na educação. No entanto, para um desavisado, que não busque se informar do quadro educacional brasileiro, a mentira do presidente vai aparecer como verdade, e o efeito disso, como se sabe, é o aprofundamento da desqualificação da educação e de seus profissionais – algo muitíssimo bom para esse governo, mas péssimo para o país, que atolará na ignorância, que sucumbirá no obscurantismo.

Assim, se Fake News fazem parte da vida do presidente, o exemplo acima justifica a postura. Para a inoperância, a incompetência, o descompromisso com a emancipação do país, com seu desenvolvimento econômico e social, principalmente para os mais pobres, nada como governar baseado em disparos em massa de mentira. Aliás, foi desse modo que ganhou as eleições. Disparando notícias falsas e caluniosas em massa sobre seus adversários. Um país que fosse realmente republicano e democrata, já teria cassado a chapa e realizado novas eleições.

Além da comparação rasteira e machista sobre o tema das Fake News ao associá-las a “mentir para a namorada”, como se isso fosse natural, o presidente presta um desserviço à própria democracia – o que é seu intento – pois nada mais destruidor para uma democracia do que a desinformação, esta parceira de governos autoritários e fascistas que ajuda a abrir caminhos para o ódio, o preconceito, a intolerância, a violência, a barbárie.

Em tempo: Paulo Freire lutou contra tudo isso, pois a educação brasileira historicamente se constituiu com as bases que sustentam o próprio país: escravização/dominação/desigualdade social. Somente uma educação sobre outros moldes – libertária, emancipadora, crítica – para superar a reprodução dessas desigualdades e da dominação. O que é péssimo para o governo Bolsonaro.

No mais, viva Paulo Freire e os professores e as professoras que continuarão a atrapalhar esse projeto de país mergulhado na ignorância e feito para poucos.

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