Dignidade menstrual: projeto social leva absorventes para mulheres em situação de rua e encarceradas em Natal
Natal, RN 24 de abr 2024

Dignidade menstrual: projeto social leva absorventes para mulheres em situação de rua e encarceradas em Natal

16 de março de 2021
Dignidade menstrual: projeto social leva absorventes para mulheres em situação de rua e encarceradas em Natal

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Mulheres em idade reprodutiva menstruam. A não ser que exista alguma condição de saúde que o impeça, a descamação das paredes internas do útero ocorre todo mês em que não há fecundação. Dessa forma, produtos de higiene íntima estão intrinsecamente ligados à rotina feminina. Mesmo assim, itens básicos como absorventes não são acessíveis a todas. 

Assim, mulheres cis ou homens trans que estão em situação de rua ou sob a custódia da justiça tem rotineiramente esse direito básico negado. Por isso, as três amigas Samara Taiana, Layla Linhares e Érica Iglesias se uniram em torno do projeto Luas, que arrecada recursos para a compra e distribuição do material entre pessoas em situação de vulnerabilidade.

Samara conta que a ideia surgiu a partir de uma preocupação delas com as condições de higiene menstrual enfrentadas pelas mulheres encarceradas. A professora universitária do curso de Direito conta que pensava na condição de "privilégio" em que vive quanto a possibilidade de atravessar o período menstrual de forma digna, enquanto outras mulheres enfrentam situações precárias e até mesmo degradantes.

"Diversas mulheres, tão mulheres quanto eu, tem que colocar, sei lá, miolo de pão dentro da vagina pra poder passar o período menstrual encarcerada", revela.

As três montaram um página no instagram onde divulgam informações do projeto e promovem campanhas de arrecadação de dinheiro para a compra dos absorventes. A primeira ideia era já receber o próprio material de colaboradores, mas a situação de pandemia inviabiliza a entrega, explica Samara. As doações em dinheiro também facilitam a montagem dos kits, já que elas podem comparar preços e comprar os produtos de uma mesma marca, garantindo a padronização dos itens entregas as beneficiadas.

"A ideia inicial era que a gente colocasse esses pontos de arrecadação, com uma caixinha, toda padronizada, com a propaganda do projeto para que as pessoas doassem o pacote de absorvente físico. Sendo que, pela questão da pandemia, a essa ideia não foi, né? E daí a gente passou a arrecadar as doações em dinheiro. O ponto positivo é que a gente consegue padronizar. Por quê? Porque a gente compra praticamente o lote inteiro do absorvente, de marca X, e com isso conseguimos fazer os kits cada um com dez absorventes, todos exatamente iguais", conta a professora.

Advogada criminalista voluntária da Pastoral Carcerária do RN Marilene Oliveira entrega kit a agente carcerária / foto: cedida

O foco inicial do projeto era para mulheres apenadas ou que estão à disposição da justiça, tanto do Complexo Penal Dr. João Chaves - Pavilhão Feminino, e do Centro de Detenção Provisória Ceará-Mirim. Nestes espaços, o Luas chega por meio de parceria com a Pastoral Carcerária, que faz a entrega dos kits comprados a partir das doações recebidas pelo coletivo.

Contudo, as integrantes perceberam também a necessidade de contemplar mulheres em situação de rua e refugiadas espalhas pela capital potiguar e contam com o Movimento Nacional da População de Rua do RN para chegar a essas pessoas. Assim, com campanhas realizadas desde agosto do ano passado, o projeto já distribuiu mais de dez mil unidades de absorventes para essas populações.

Sistema jurídico machista e burguês é barreira para criação de políticas públicas, avalia professora

Abandono familiar, a falta da garantia de bem-estar social pelo estado e a pobreza menstrual são algumas das questões que tornam o projeto necessário. Como professora de Direito, Samara explica que, a partir do momento em que são detidas, as mulheres passam a não receber mais visitas de parentes ou cônjuges e, mesmo que não tenham uma pena determinada pela Justiça, já não podem mais contar com o apoio das pessoas próximas para manter condições de higiene.

Da mesma forma, o material não é oferecido pelas cadeias públicas e penitenciárias, mas há omissão do Estado em garantir esse serviço essencial, argumenta Samara.

"Estamos tratando de um sistema jurídico extremamente burguês e machista. Então, por qual razão haveria a formulação de uma política pública que versasse sobre o auxílio que deve ser tratado e que deve ser destinado ao período menstrual de mulheres encarceradas? Não existe nem mesmo para mulheres libertas, que não estiveram em nenhum momento da vida em conflito com a lei. Se nem pra essas mulheres existe políticas públicas efetivas, que dirá pra mulheres que são encarceradas", pontua.

Já a pobreza menstrual trata sobre os custos ligados ao período menstrual. Já que além de dinheiro para comprar absorventes e material de higiene pessoas, as mulheres precisam de acesso a banheiros com acesso a água e saneamento básico. O que acaba estando fora da realidade de populações mais pobres, principalmente mulheres em situação de rua e pessoas que vivem em abrigos ou campos de refugiados.

A integrante do Luas lembra que o projeto é voltado exclusivamente a oferta de absorventes e não abarca outros itens de higiene pessoal, como escovas de dente ou sabonetes.

"Não arrecadamos isso porque o espírito do projeto é a questão que inquietava a nós três enquanto mulheres privilegiadas, que era essa questão da dignidade menstrual, de como uma mulher que não tem acesso as mesmas coisas que nós, atravessa esse período menstrual".

Doações para o projeto Luas podem ser feitas em dinheiro, via transferência ou boleto bancário.

Dados bancários:

NuBank

Titular: Érika Longa Iglesias
Agência: 0001
Conta: 5884898-7

Banco do Brasil
Layla de Oliveira Lima Linhares
Agência: 0716-1
Conta: 55147-3para as contas:

Mais informações disponíveis na página do projeto.

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