Sem escola, sem recreio, sem futuro
Natal, RN 29 de mar 2024

Sem escola, sem recreio, sem futuro

24 de março de 2021
Sem escola, sem recreio, sem futuro

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Por Joana Suarez, Luiza Muzzi e equipe LC

O ano é 2020: três irmãos de 12, 13 e 14 anos pediam dinheiro nos arredores de um shopping em São Luís, no Maranhão. No Sul do Brasil, em Barra do Ribeiro, um menino de 14 anos aumentou a jornada na roça do pai e dos vizinhos. Em um engenho de cana no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, um garoto de 13 anos teve a mão amputada ao sofrer um acidente operando máquina. Também na zona rural, agora do Centro-Oeste, 14 adolescentes estavam sendo escravizados no campo. Na outra ponta, ao Norte, uma criança de 10 anos limpava a casa dos patrões da mãe, faxineira no Amapá. 

Em todas as regiões brasileiras, a equipe do projeto jornalístico Lição de Casa (que faz coberura independente dos impactos da pandemia na educação brasileira) identificou pelo menos 70 meninos e meninas de 10 estados e do Distrito Federal que foram vítimas de exploração do trabalho infantil no primeiro ano da pandemia do coronavírus. 

A reportagem especial Sem Recreio traz relatos de pequenos cidadãos que deixaram o estudo e a infância de lado para exercer as mais diversas funções laborais, em busca de sobrevivência, complemento da renda familiar ou mesmo ocupação do tempo em que estariam aprendendo nas escolas que foram fechadas. 

Informações sobre o trabalho infantil envolvendo menores de 14 anos não deverão constar na Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (Pnad Contínua) de 2020 devido às reduções no orçamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E esse é um dos levantamentos mais importantes para entender o cenário. Os dados de 2019 revelavam 1,8 milhão de crianças e adolescentes, com idades entre 5 e 17 anos, em situação de trabalho precoce. 

Os números relativos ao ano passado (a serem divulgados) dificilmente refletirão a realidade vivida por essa população em todo o Brasil durante a crise da covid-19, considerando que ainda há subnotificação. Ao menos parte das histórias será visibilizada neste material feito a muitas mãos – uma investigação nacional sobre essa violação infantil, a partir da evasão escolar. 

O termo adequado seria ‘exclusão escolar’, já que “é responsabilidade do Estado brasileiro garantir uma educação pública laica, de qualidade e inclusiva”, defendeu Tânia Dornellas, assessora do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI). 

Denúncias

No primeiro semestre de 2020, o Disque 100 (Direitos Humanos) recebeu, em média, 10 denúncias por dia referentes à exploração da mão de obra infantil. O dado inédito, obtido pela reportagem via Lei de Acesso à Informação, aponta que em todo o país foram 1.859 registros em seis meses. No ano de 2019, eram cerca de 11 denúncias diárias (um total de 4.246 em 12 meses). Apesar de aparentar uma ligeira queda, no ano passado o número pode ser lido como alto, de acordo com especialistas, justamente por estar subnotificado em uma época atípica de isolamento social. 

Doze jornalistas espalhados pelo país foram às ruas e fizeram escuta de profissionais que estão na ponta, diante de famílias vulneráveis, e perceberam a intensificação do problema. As situações que abriram essa matéria foram vistas e narradas por um professor, um conselheiro tutelar, um auditor fiscal, um procurador do trabalho e um dos repórteres. Foram entrevistadas mais de 20 fontes, incluindo pesquisadores, especialistas e representantes de entidades ligadas à temática. 

Os relatos contemplam as piores formas de trabalho precoce: trabalho doméstico, análogo à escravidão, tráfico de drogas, lavouras, garimpo, catação, mendicância, aplicativos de entrega. Mas também há casos que costumam ser romantizados ou relativizados, como filhos “ajudando” na lanchonete dos pais ou fazendo doces para vender no bairro, contribuir em casa, comprar um presente. 

“A sociedade brasileira é muito conivente com o trabalho infantil. De todas as violações de direitos, essa é a mais aceita

Tânia Dornellas, assessora do FNPETI

Qualquer trabalho, exceto na condição de menor aprendiz, limita o acesso às condições adequadas de ensino e desenvolvimento, explica Ana Carolina Fonseca, oficial de programas do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) no Brasil. 

“Eles são privados de brincar, de estar com seus pares e de vivenciar a infância e a adolescência”. 

Por sobrevivência, adolescentes se arriscam como entregadores de aplicativos durante a pandemia. Foto: Joana Suarez

Feijão do campo para a cidade

A alimentação, ou a falta dela, conecta crianças de diferentes regiões descobertas pela equipe do Lição de Casa

Os pais de Carlos*, de 8 anos, e Júlia*, de 6 anos, se dividem entre trabalho informal na agricultura e coleta de lenha que vendem para fábricas de carvão. Eles moram em São Tomé, município rural a 120 km de Natal, no Rio Grande do Norte. Todo fim de ano, durante o período chuvoso, vão para a capital vender feijão verde. Em 2020, sem escola, as crianças foram junto e ficaram nas ruas oferecendo o alimento junto com os pais.

 A mãe, de 27 anos, conseguiu ser aprovada para receber o auxílio emergencial, mas teve o benefício cortado sem justificativa no segundo mês de pagamento. A avó, que ajudava cuidando das crianças, contraiu covid-19. As atividades escolares remotas logo foram abandonadas, e os filhos foram para as saídas dos supermercados da capital potiguar.

 “Eu não gosto de ter que trazer eles. Mas não tem com quem deixar, o que vou fazer?”.

Mãe de Carlos e Júlia.

Sendo quatro pessoas, a família se espalha pelas ruas e consegue vender mais. Nos períodos sem cliente, pedem dinheiro no sinal de trânsito. O menino fala da saudade das brincadeiras no recreio escolar e sente falta da avó que ficou em São Tomé. “Estou acostumado a ficar mais com os velhos”, disse ele.

Em busca de alimento 

Nos estados de Pernambuco, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, as criança e adolescentes que encontramos estavam fazendo, vendendo ou carregando comida porque a realidade financeira em casa havia piorado durante a pandemia.

Maia*, de 13 anos, passou por cima do sofrimento com a morte da avó, que pegou covid, em meio aos sanduíches que fazia e entregava pelo seu bairro em Recife. A renda da casa caiu muito após o desemprego da mãe diarista e sem a aposentadoria da avó. A menina praticamente trocava a noite pelo dia, e os estudos, a essa altura, se reduziram a ajudas virtuais de colegas para que ela passasse de ano. 

Sem a escola, sobrou para Vinícius* e Ricardo*, irmãos de 10 anos, vender os salgados, feitos pela mãe, na praça central da cidade de São Borja. A família de oito filhos vive em um assentamento no Rio Grande do Sul. 

A calçada de um supermercado em Belo Horizonte substituiu a sala de aula nas manhãs e tardes de Kevin*, de 7 anos. Lá, ele recebia uns trocados carregando sacolas com as compras e comidas dos clientes. 

*Os nomes das crianças e adolescentes são fictícios para proteger a identidade deles, mas as narrativas são reais, flagradas no ano passado.

Distantes do olhar protetor dos educadores 

Pelas mãos machucadas de seus alunos, o professor Gilberto Bazilewicz aprendeu a reconhecer aqueles que trocavam os livros pela lavoura. Foto: Emilene Lopes

A ausência de estatísticas, a subnotificação e a falta de ações governamentais tornam-se mais graves somadas ao afastamento dos alunos do olhar atento de um professor. Eram os educadores em sala de aula que acolhiam quando a casa e a rua oprimiam. A distância e as telas intermediando o contato tornaram-se barreiras para essa relação de afeto e cuidado.  

O professor Gilberto Bazilewicz conseguia, olhando as mãos calejadas dos seus alunos, perceber aqueles que estavam trabalhando pesado nas lavouras em Barra do Ribeiro, município pequeno e rural que fica a 56 km de Porto Alegre. Ele aprendeu a reconhecer o que viveu na própria infância. Gilberto abandonou a escola aos 14 anos pela lida no campo. Desde os 10 morava em uma fazenda onde recebia abrigo, comida e dinheiro em troca de serviço. 

Quando os meninos estavam na escola, havia ao menos um turno garantido, dedicado ao aprendizado e à vivência da idade. Os educadores sentem o quanto foi perdido agora e ainda não sabem se será possível recuperar:

“Alguns (estudantes) já me disseram que conseguiram trabalho na pandemia, não vão voltar depois” 

Gilberto Bazilewicz, professor 

Folhas em branco

Em várias comunidades brasileiras onde alunos têm dificuldades de acesso à internet, o aprender virou apenas folhas de tarefas entregues pela escola. Esses papéis são devolvidos, por vezes, sem resposta, ou nem isso. Muitos desapareceram quando o desemprego e a insegurança alimentar se impuseram. 

Entre as crianças que a reportagem encontrou, várias foram forçadas ao trabalho por essa maior vulnerabilidade fora da escola. Manuela*, filha de catadores no Rio Grande do Sul, estava entregando as atividades em branco e os professores souberam que ela catava latinhas nas ruas para não ficar sozinha em casa. 

Grande parte das histórias que constam no mapa do especial Sem Recreio vieram à tona por meio de professores e diretores que estão preocupados com suas salas reduzindo de 40 para até 5 alunos nas plataformas online. 

Em Macapá, a pequena Catarina* tinha compromissos incompatíveis com seus 11 anos de vida. Vendia doces, cuidava da irmã mais nova e trabalhava em um espetinho à noite. Nem se ela quisesse ou os professores ajudassem, seria possível, com essa rotina, assistir aulas de manhã pela tela quebrada do celular. 

A reportagem procurou o Ministério da Educação para saber quais foram as ações nacionais para combater a evasão escolar. A pasta destacou duas medidas: um webinário em parceria com o Unicef para promover a busca ativa dos alunos, e um plano emergencial de contribuição financeira com as escolas para elas se reestruturarem para o retorno presencial (sem informar valores). 

Uma violação invisível

Trocados arrecadados são, para uns, complemento da renda da família; para outros, questão de sobrevivência. Foto: Victoria Alvares

Narrativas que promovem o trabalho infantil aparecem mais fortes nos contextos de crise. A mentirosa ideia de que é “melhor estar trabalhando do que na criminalidade”. O crime, na verdade, é também um local de exploração. O tráfico de drogas recruta muitas crianças e consta na lista das piores formas de trabalho infantil. Mas os adolescentes pegos com traficantes não são vistos como vítimas, apenas como infratores. 

Júlio*, de 12 anos, desistiu de estudar por causa da aprendizagem remota no ano letivo de 2020. Passou a ficar mais tempo nas ruas da favela em que mora, na cidade de Belo Horizonte. Desviado da rede de proteção, foi convocado para ser olheiro do tráfico. 

“É algo que acaba sendo mais visto como crime, não como trabalho infantil, apesar de ser uma exploração grave, pois muitos perdem a vida”, ponderou Alessandra Kelly Vieira, que analisou como a justiça juvenil tem privilegiado as medidas punitivas em vez das protetivas (e preventivas), em recente doutorado em Psicologia Social na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). 

Quando as pessoas ficam indiferentes a essa violação, de alguma forma estão sendo também coniventes. Em um restaurante na periferia de Belo Horizonte, a conselheira tutelar Rosimeire Pinto Trindade esbarrou com Marina*, de 8 anos, ajudando a mãe com os clientes durante a pandemia. Para se defender, a genitora disse que se a filha não estivesse ali, estaria na rua, e que isso seria pior.

Rosimeire destaca que as famílias são numerosas e precisam de renda. “Foram criadas assim (trabalhando desde cedo), já é uma constante na cultura deles”. A conselheira explicou que queria que a criança estudasse para ter um trabalho digno e protegido. “Mas com as escolas fechadas é tudo mais difícil”. 

O trabalho infantil atinge, majoritariamente, crianças pobres, em geral negras ou pardas, moradoras da periferia, conforme o perfil mais comum dessas vítimas. Mas a interface dessa violação com o racismo e a pobreza é pouco percebida.

Turno e contraturno 

Para crianças e adolescentes que já tinham o trabalho como uma imposição antes da covid-19, as horas diárias debruçadas ao serviço foram intensificadas.  No município de Barra do Ribeiro, interior do Rio Grande do Sul, André*, de 14 anos, já ajudava o pai na lavoura no contraturno escolar e aumentou sua carga de trabalho, ocupando os horários sem as aulas presenciais com serviço para os vizinhos. No mesmo estado, em São Luiz Gonzaga, Danilo*, de 15 anos, dobrou o expediente como ajudante de pedreiro. 

Aprendiz para poucos

Muitas famílias tiveram a renda impactada e a percepção de quem vai a campo é que não adianta apenas falar “não pode trabalhar”; há que se oferecer alternativas. 

“Eles podem, desde que seja na idade correta e em uma ocupação que lhes assegure dignidade”, explica Maria Cláudia Falcão, coordenadora do Programa de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho do Escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil. 

Quem teve a oportunidade de passar pela aprendizagem profissional, por exemplo, costuma ver a experiência como decisiva para vencer as limitações da própria condição social. Mas a possibilidade de trabalho como menor aprendiz não é uma realidade na zona rural ou em cidades de pequeno porte, já que não há, nesses ambientes, quem gere essas vagas: 

“Precisamos agir rápido. Antes já havia um ‘gap’ enorme entre os alunos da escola privada e os da pública, com a pandemia essa distância vai aumentar ainda mais”

 Maria Cláudia, diretora da OIT.

O que acontece na infância não fica na infância. Crianças que vivem a exploração do trabalho acumulam alterações osteomusculares e falhas de desenvolvimento físico, mental e psíquico. 

Aparecida**, de 57 anos, tornou-se empregada doméstica aos 10 para ajudar a pagar o aluguel de onde morava. Enquanto ela crescia, já era babá de filhos dos outros, limpava a casa e fazia as refeições da família de classe média de Belo Horizonte. 

“Eu lavava prato enquanto balançava a menina (na cadeirinha) com o pé”, lembra Cida, que depois de adulta ficou apaixonada com bonecas – foi quando pôde comprar uma. 

Para evitar o assédio do patrão que ia ao quarto de empregada à noite, Aparecida decidiu não dormir mais no serviço e preferia enfrentar horas de ônibus de madrugada nos trajetos entre periferia e área nobre. Ainda herdou dessa relação trabalhista ilegal o alcoolismo, já que a bebida era oferecida a ela pelo casal “empregador” constantemente. “Foi muito difícil, só me curei depois que virei evangélica”.

**Nome fictício para proteger a identidade da entrevistada

Sempre nefasto

A equipe do Lição de Casa descobriu o exemplo extremo de Antônio*, de 13 anos, que perdeu uma mão por causa da exploração infantil em um engenho, mas também investigou histórias muitas vezes já normalizadas, como a de Rafaela*, que aos 10 anos seguia por caminho semelhante ao de Aparecida, já aprendendo e dividindo serviço de doméstica com a mãe. 

No caso de Rafaela, a ausência da escola por uma crise sanitária mundial foi o que a levou à casa dos patrões. Mas, estando lá, não lhe foi permitido ser menina, brincar ou ler livros; precisava justificar sua presença. 

As oportunidades concedidas a Antônio, Rafaela e às dezenas de crianças que localizamos na produção do Sem Recreio não são as mesmas recebidas por aquelas que crescem protegidas em casa. Trabalhar precocemente não gera qualquer qualificação nem prepara para o mercado. 

Com a formação comprometida, menor a chance de empregabilidade, restando funções mal remuneradas. “O risco é aquela criança repetir esse histórico de vida com seus filhos e netos; é o que chamamos de ciclo intergeracional da pobreza”, explicou Luciana Coutinho, procuradora do Ministério Público do Trabalho em Minas Gerais. 

Pessoas resgatadas do trabalho escravo comumente passaram pelo trabalho infantil e não concluíram os estudos. Ficam cada vez mais expostas às violações. 

“Você não permitir que o ser humano se torne crítico, com habilidades que vão ajudar no futuro, é muito perverso”, enfatizou Tânia Dornellas, especialista em Políticas Públicas e em Ensino Interdisciplinar em Infância e Direitos Humanos.  

No primeiro ano de pandemia, em três operações de resgate no Mato Grosso do Sul tinham menores de idade – o que surpreendeu o auditor fiscal do trabalho Antônio Parron. 

“Fazia muito tempo [desde 2003] que eu não via tanto menino assim em serviço pesado”, afirmou ele, que está nessa função há 25 anos.

Oito adolescentes foram escravizados no município de Nioaque. Em Porto Murtinho, dois indígenas de 14 e 15 anos foram resgatados fazendo limpeza de pasto com uso de agrotóxico. Estavam em condições semelhantes à escravidão havia dois meses, alojados em barracos de lona, sem banheiro, no meio do mato. 

Desmonte de políticas públicas 

A covid-19 não era uma ameaça quando a ONU decidiu que 2021 seria declarado o Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil. No Brasil, a luta pela erradicação, já complexa, esbarrou em um desafio anterior ao fechamento das escolas: o desmonte de políticas públicas. Centros de Referência de Assistência Social e os Conselhos Tutelares estão fragilizados

Além dos cortes orçamentários, inclusive com a redução de equipes, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) – instância máxima de deliberação de políticas para os menores – atualmente funciona por força de liminar

Essa sequência de retrocessos afeta diretamente o combate. 

“A pandemia encontrou o Brasil em situação de imunidade baixa”, reflete Tânia Dornellas, assessora do FNPETI.

 O governo brasileiro não trata essa pauta como prioridade, analisa  a procuradora Ana Maria Villa Real, coordenadora nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente no Ministério Público do Trabalho (MPT). A procuradora cita a revogação, por quase dois anos, do decreto que instituía a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (Conaeti) – retomada apenas em dezembro de 2020, mas excluindo a participação de entidades e da sociedade civil. 

O Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, se estivesse com sua comissão vigente, explica Ana Maria, poderia ter possibilitado o estabelecimento de estratégias de enfrentamento para os períodos durante e pós pandemia. Mas isso não aconteceu. 

Procurado pela reportagem, o governo federal, por meio do Ministério da Cidadania, negou cortes orçamentários no Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Mas um levantamento do Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social (Congemas) com base nas Leis Orçamentárias Anuais (LOA) apontou que 2020 teve o pior montante para a área desde 2012: R$ 1,36 bilhão, contra uma média de R$ 2,27 bilhões dos últimos nove anos. Em 2021, a redução de repasses pode chegar a 59,3%.

“Estamos falando de um país que já havia saído do mapa da fome, e agora passa a conviver com déficits progressivos no momento em que a população está mais precisando”,

Elias Sousa Oliveira, presidente do Congemas. 

Caminhos

“Na luta contra o trabalho infantil e pela promoção dos direitos das crianças e adolescentes a gente tem que esperançar sempre”, afirma a procuradora do trabalho Ana Maria Villa Real. Existem várias formas de mudar o cenário, mas o voto é uma ferramenta de mudança estrutural, elegendo parlamentares que tenham compromisso efetivo com a infância. 

O número de trabalhadores precoces no Brasil vinha em uma tendência de redução. “Isso não foi de graça, houve muita luta, mobilização social e investimento em políticas públicas”, detalha a procuradora Luciana Coutinho.  

Uma das principais políticas da área, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) está com os repasses paralisados desde 2019 e sem expectativa de retomada, lembra Luciana. A iniciativa foi criada pelo governo federal para proteger crianças e adolescentes por meio de estratégias que incluem um auxílio financeiro pago às famílias. 

Por meio de nota, o Ministério da Cidadania alegou que os recursos são transferidos desde 2014 e que há saldo em conta de mais de R$ 41 milhões do Fundo Nacional de Assistência Social que não foram acessados pelos estados e municípios, “por motivos diversos”. Quem trabalha na ponta contesta. Os repasses mensais foram interrompidos, sendo as últimas transferências do PETI feitas em 2018, assegurou Elias Oliveira, presidente do Congemas.

Um pacto coletivo de valorização da educação, com colaboração de cada território, é o que sugere Ana Carolina Fonseca, oficial do Unicef no Brasil. Quando o ensino presencial for retomado, “as comunidades precisam abraçar suas escolas e apoiá-las nesse processo, acolhendo essas crianças em uma perspectiva integral”. E para isso não devemos esperar, pontua Ana Carolina, que as portas das unidades se abram novamente.

***

Repórteres colaboradores nos estados: Bibiana Maia, Bruno Tadeu Moraes, Djuena Tikuna, Emilene Lopes, Laís Martins, Larissa Burchard, Luiza Nobre, Mariana Ceci, Thais Rodrigues e Victória Alvares

Esta reportagem foi financiada pelo Edital de Jornalismo de Educação, uma iniciativa da Jeduca e do Itaú Social.

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