Com último concurso em 2015 e sem reposição de aposentados, fila do INSS cresce no RN
Natal, RN 20 de abr 2024

Com último concurso em 2015 e sem reposição de aposentados, fila do INSS cresce no RN

21 de julho de 2021
Com último concurso em 2015 e sem reposição de aposentados, fila do INSS cresce no RN

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No Rio Grande do Norte, o INSS é um dos órgãos mais atingidos pela política adotada nacionalmente de não repor funcionários aposentados. O último concurso foi realizado em 2015 com apenas 950 vagas para todo o país, sendo 20 para o Rio Grande do Norte distribuídas entre Natal (12) e Mossoró (8). Enquanto isso, apenas na Gerência de Natal, dez funcionários conseguiram se aposentar em 2021.

“O governo vende que a redução de funcionários é uma vantagem, é a tragédia do Brasil. Temos órgãos públicos esvaziados, o home-office não atende o cidadão como deveria, o segurado não consegue acessar os benefícios do INSS e também não consegue ser atendido em outros órgãos. Pela primeira vez o governo conseguiu reduzir a folha sem fazer qualquer corte porque não faz concurso há cinco anos. Alguns estudiosos apontam que o INSS tem uma demanda de até 2,5 milhões de processos não atendidos”, denuncia Moacir Lopes, diretor da Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (FENASPS).

Os processos que eram atendidos por cada servidor que se aposentou e que não foi reposto, são redistribuídos entre aqueles que permanecem ativos no órgão, o que aumenta o número da fila virtual.

“Imagine que o INSS perdeu 12 mil trabalhadores entre 2019 e 2021. Se você pegar esses 12 mil e multiplicar por 100 (que é a média de processos atendidos por cada servidor), você vai ter mais de um milhão de processos nessa situação. Hoje, 95% dos serviços podem ser acessados digitalmente, mas o próprio governo, por cobrança de tribunais, órgãos de controle e Ministério Público Federal, está fazendo um projeto de atendimento semipresencial para o cidadão que não tem acesso às redes sociais. É uma demonstração que, até para admitir o erro que cometeram”, expõe Moacir Lopes.

FUNCIONÁRIOS QUE SE APOSENTARAM NO INSS - GERÊNCIA NATAL:

2017 - 63

2018 - 73

2019 - 52

2020 - 06

2021 – 10

Sucateamento atinge mais pobres

A taxa de reposição de funcionários públicos que se aposentaram atingiu o menor índice da história durante o governo Bolsonaro. Enquanto em 2007 o Brasil tinha 333,1 mil pessoas trabalhando no serviço público, em 2020, esse número caiu para 208 mil servidores públicos estatutários, o que lhes garante direito a estabilidade e planos de progressão da carreira. Os dados são do Painel Estatístico de Pessoal (PEP), do governo federal.

“O prejuízo é claro, menos servidores compromete a qualidade do serviço ofertado; particularmente nas áreas da saúde e da educação. Sempre é importante lembrar que o serviço público tem características distintas do mercado privado. Enxugar pessoal no serviço público é burrice. Serviço público trata de pessoas, não de mercadorias. Logo, o serviço público funciona com outra lógica, a da prioridade à pessoa humana e aos interesses republicanos. Menos servidores é a porta de entrada para que o serviço público seja invadido por interesses privados. O enxugamento do serviço público tem a ver com a ideologia do Estado mínimo que preconiza a transferência de atividades do Estado para o mercado. Trata-se de uma séria ameaça de sucateamento do Estado, a única força política que pode obstaculizar a cobiça desmedida do mercado”, alerta César Sanson, sociólogo e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Além de bons salários, um dos atrativos para quem procura o serviço público é a estabilidade no emprego, que se mostrou mais do que necessária no exemplo prático e recente do caso de Luís Miranda, servidor do Ministério da Saúde responsável por denunciar um esquema de corrução na compra de vacinas para combate da covid-19.

“Não fosse a estabilidade do servidor, jamais essa denúncia teria sido realizada, porque o servidor com receio da demissão não a teria feito. A estabilidade e autonomia do servidor é indispensável para a defesa dos interesses republicanos”, adverte Sanson.

Até o momento, um total de 1,2 mil contratações foram efetivadas no serviço público federal em 2021 me todo o país. Valor insuficiente para reposição da massa de trabalhadores aposentados, um número que aumentou, principalmente, diante dos ataques ao serviço público nos últimos anos com as reformas trabalhistas e previdenciária, além de outras medidas como a aprovação do teto de gastos em 2015 e o congelamento dos concursos públicos por Bolsonaro em 2020, que achou melhor liberar a contratação de 20 mil trabalhadores temporários.

“O resultado imediato já pode ser observado nas filas gigantescas do INSS, na suspensão do censo, no fechamento de postos de serviços como os Correios, agências bancárias e, inclusive, escolas de forma integral e por turno. Temos perdido equipes completas de saúde, dentro do SUS, mesmo durante a pandemia. A médio prazo teremos o estrangulamento da oferta dos serviços, mas também a perda dos direitos universais que são prerrogativa da nossa Constituição Federal, que vem sendo desestruturada, como é o caso do direito universal à saúde, à educação e à segurança. A longo prazo, o modelo de estado mínimo deve ser instituído e as perdas serão evidentes em todos os níveis de gestão - municipal, estadual e federal -, pois é importante lembrar que a reforma administrativa ataca todo o funcionalismo público trazendo, além da perda dos serviços prestados à população, o empobrecimento dos próprios municípios e estados na medida que estes servidores também consumirão menos e com menor poder de compra. Além disso, também teremos menor arrecadação de impostos”, também alerta Oswaldo Negrão, professor da UFRN e presidente da Associação dos Docentes da UFRN (Adurn).

Consulta virtual dificulta acesso ao BPC

A precarização do serviço acabou afetando, também, o público que recebe o BPC (Benefício de Prestação Continuada) durante a pandemia da covid-19. Com a redução dos atendimentos presenciais, fazer entrevista através de tablet, computador e celular para quem vive em situação de miséria, tornou o acesso ao benefício ainda mais difícil.

“Como fazer esse atendimento ao cidadão se onde ele mora não tem acesso a internet e ele não consegue acessar um celular? Tem algo de muito errado nesse governo, a não ser que ele tenha a intenção de não aposentar ninguém e cortar o benefício na marra. As pessoas vão ficar numa situação pior. Outra coisa é que, imagine que o BPC (Benefício de Prestação Continuada) tem uma fila de 500 mil cidadãos para serem analisados só que, agora, o INSS implanta um atendimento virtual. Então, como é possível você avaliar o cidadão virtualmente? Por exemplo, se na gerência do Sul cair um processo do Macapá, Acre ou mesmo do Rio Grande do Norte ou outro estado do Nordeste, como vou avaliar a sua situação psicossocial, de vida, de família e onde ele mora, saber se os dados que ele informa são verdadeiros, sem poder dialogar e ter acesso a ele? Esse é um problema que já temos informado ao INSS há um bom tempo", denuncia Moacir Lopes, diretor da Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social.

A retirada de dinheiro da previdência para aplicação em outras áreas sem qualquer reposição, é outro ponto nunca esclarecido e que ajuda a explicar o atual discurso de déficit no setor.

"O INSS tem um problema muito concreto que não tem uma solução a médio prazo, o que acontece hoje é resultado de uma gestão incompetente que não consegue enxergar qual seu trabalho efetivo. A previdência pública tem um século de existência e esse dinheiro foi sendo usado para tudo, de Itaipu à Ponte Rio-Niterói, menos para investir no próprio fundo de previdência do cidadão. Eles reclamam que a vida deles é administrar o INSS, mas não é verdade. A União deve R$ 1 trilhão à Previdência, tem que repor o caixa e discutir com o cidadão o seu benefício”, critica Moacir. 

O barato que sai caro

Ao contrário do que muita gente pensa, o Brasil é um país com poucos servidores públicos, segundo dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A instituição aponta que enquanto países considerados desenvolvidos possuem a proporção entre servidores públicos e total de trabalhadores de 21%, no Brasil, essa proporção é de apenas 12%.

“A não reposição de servidores é parte de uma política de desmanche do serviço público e gratuito no Brasil. A redução na quantidade de servidores causa diminuição da qualidade dos serviços públicos levando, assim, ao descrédito por parte da população. Essa falta de credibilidade facilita a implementação de reformas que pioram ainda mais o acesso e a qualidade dos serviços à todo povo enquanto favorecem os lucros e enriquecimento de poucos. Dentre essas reformas podemos citar a emenda constitucional do congelamento de 2016, reformas trabalhistas de 2017 e 2019 e da previdência de 2019, os cortes no orçamento da educação e da saúde, por exemplo. Ao contrário do que foi prometido pelos seus defensores, nenhum problema social ou econômico do Brasil foi solucionado após a aprovação desses projetos acima citados. Muito pelo contrário: o país voltou a fazer parte do mapa da fome. Há mais de 14% de brasileiros desempregados, o PIB despencou e a dívida pública aumentou. Enquanto isso, os bilionários brasileiros ficam R$ 34 bilhões mais ricos durante a pandemia”, analisa Leonardo Guimarães, servidor do IFRN (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte) e coordenador de política e formação sindical do SINASEFE (Sindicato Nacional dos Servidores da Educação Básica, profissionais e tecnológica) em Natal.

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