Vamos falar de democracia?
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27 de novembro de 2020
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"Eu também sou vítima de sonhos adiados,
de esperanças dilaceradas, mas, apesar disso,
eu ainda tenho um sonho, porque a gente não
pode desistir da vida"

Martin Luther King

Para entender melhor o conceito de democracia na sociedade ocidental, remontaremos à Grécia antiga. Foram os antigos gregos que criaram os conceitos de cidadania e democracia que se estendiam àqueles que eram considerados cidadãos e poderiam, portanto, exercer o seu poder de participar da política da cidade. Contudo, essa democracia era restrita a poucos. Com a Revolução Francesa e o Iluminismo, essa concepção de democracia sofreu uma ruptura, mas ainda ficou restrita. Até que o movimento feminista, em 1893, Nova Zelândia, consegue o voto feminino.

Mas qual a relação que esse conceito tem a ver com o que aconteceu, no último domingo, 15 de novembro, data em que o Brasil “comemorava” a Proclamação da República? 148 milhões de eleitores deveriam ter comparecido para escolher os seus novos representantes para as 5.568 câmaras municipais e os respectivos chefes dos executivos municipais. Digo comparecido porque, infelizmente, o descrédito na atuação política com muitos parlamentares e de chefes do executivo tem produzido, ano a ano, altos índices de abstenções, votos brancos e nulos. Segundo dados do TSE, 45 milhões de eleitores ou 30,1% resolveram não comparecer, votaram nulo ou branco. Ou seja, se, num dado momento histórico, a crítica ao processo democrático era a ausência de participação dos eleitores ou da possibilidade de ser eleito , a eleição deste ano vai na contramão das reivindicações pretéritas, ou seja, hoje ainda temos a possibilidade de escolher candidatos, que vão da extrema direita a extrema esquerda, mas muitos preferem a omissão por desacreditar do processo democrático.

Como explicar esse fenômeno, para um país que flerta sistematicamente com golpes de estado? Em que ditaduras se fizeram presentes, de forma sistemática, os vários momentos infelizes da nossa história? Ou, neste momento histórico, em que ocasião a ditadura se apresentou travestida de autoritarismo líquido, com um novo modus operandi de aparelhamento das instituições públicas, cujas pessoas, altamente alinhadas aos seus criadores, implementam barbaridades administrativas em todos os espaços governamentais do país? Como entender a apatia da população em um momento tão importante para nós, cidadãos e cidadãs? O que tem gerado essa apatia?

Primeiro, o descrédito com a ausência de políticas públicas que atendam toda a sociedade. Segundo, a falta de formação política da população que gera o total desconhecimento da importância das ações políticas na melhoria dos índices de qualidade de vida da população. Terceiro, o processo de nivelamento (por baixo) de muitos quadros políticos do país, cuja negação à política e a necessidade do “novo”, da “nova política” emergem com muita força. Quarto, a existência de um discurso cínico e mentiroso, que tenta incutir nas pessoas que, antes da reabertura do processo democrático do país, vivíamos num paraíso. Nesse paraíso, não existia fome, pessoas não morriam por falta de atendimento em hospitais, não existia analfabetismo, não existia inflação e, acima de tudo, não existia a corrupção, o grande mal do nosso país que, segundo alguns, nasce com o processo de redemocratização e se acentua a partir de 2003 - o grande problema de não gostar e faltar as aulas de História. Esses são alguns dos pressupostos que arrisco deixar como reflexão, para entender esse processo de negação da política e do processo democrático.

Enquanto nos debruçamos em tentar entender a falta de participação política dos cidadãos e cidadãs brasileiros na tomada de decisões, de forma minimamente representativa, pois, infelizmente, sabemos que a falta da representação popular gera parlamentos e executivos que não representam a maioria da população, nas Instituições de Ensino Superior e nos Institutos Federais, parece que voltamos aos regimes ditatoriais, em que tínhamos a nomeação de senadores, deputados, prefeitos e reitores biônicos que não passavam pelo crivo do voto e eram subservientes aos mandatários centrais, visto que o processo democrático, garantido pela Constituição cidadã de 1988, em seus artigos 206 e 207 que afirmam os princípios da gestão democrática e da autonomia didático/científica, tem sido constantemente desobedecidos de forma sumária. Desde 2019, temos visto os processos democráticos, que nascem com as eleições diretas para escolha dos gestores máximos, sendo deslegitimados. Os votos dos professores, professoras, alunas, alunos e equipe pedagógica são negligenciados. Seria como se, em uma eleição para Presidente, o TSE nomeasse o terceiro mais votado do pleito ou até alguém que não participou, mas tem um alinhamento com o Presidente do TSE. Um verdadeiro contrassenso. É como se não vivêssemos num país plural. Hoje já são 18 Instituições Federais que sobrevivem com gestões impostoras, sendo 15 Universidades, 2 institutos Federais e um CEFET/RJ, uma verdadeira afronta à democracia. Tal atitude é traduzida no dia a dia destas instituições por uma gestão sem legitimidade, cuja capacidade de resolutividade dos problemas é pequena e, por conseguinte, persegue membros dos conselhos superiores, tendo como marca principal a falta de diálogo com a comunidade.

Por fim, precisamos, enquanto sociedade, fomentar a formação política, ampliar a nossa representação no parlamento, mesmo tendo a clareza de que, na perspectiva capitalista, em um país periférico como o nosso, o capital sempre estará entranhado ao sistema, ou seja, não podemos ser ingênuos. Mas, como disse, certa vez, o primeiro ministro britânico, Winston Churchill: “ a democracia é o pior dos regimes políticos, mas não há nenhum sistema melhor que ela”.

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