Wilmismo renasce mais vermelho e se engaja na campanha de Fátima
Natal, RN 19 de abr 2024

Wilmismo renasce mais vermelho e se engaja na campanha de Fátima

5 de outubro de 2018
Wilmismo renasce mais vermelho e se engaja na campanha de Fátima

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Num cenário dominado por homens, famílias tradicionais e pela prática do coronelismo, Fátima Bezerra e Wilma de Faria quebraram a corrente e foram protagonistas, nos últimos 20 anos, de embates históricos na política do Rio Grande do Norte. De 1996 até 2014, a petista e a Guerreira se enfrentaram três vezes em eleições majoritárias e apoiaram uma a outra em pleitos específicos.

Foram duas disputas para a prefeitura de Natal e uma para o Senado. Wilma venceu as duas primeiras (1996 e 2000) e se tornou a primeira mulher a ocupar a principal cadeira do palácio Felipe Camarão. Fátima levou a melhor na última disputa, em 2014, na mais acirrada eleição para o Senado até o pleito deste ano.

É inegável o pioneirismo também da ex-governadora Rosalba Ciarlini como mulher a conquistar postos de destaques na política local. Além chefiar o Executivo estadual, a Rosa foi a primeira senadora eleita do Estado e administrou por quatro vezes a prefeitura de Mossoró. Porém, diferente de Fátima e Wilma, Rosalba Ciarlini sempre foi um instrumento da oligarquia Rosado no Estado e com perfil mais conservador.

Adversárias históricas, pero no mucho. Entre uma disputa e outra, Fátima e Wilma também caminharam lado a lado. Como o PT passou a priorizar o projeto nacional que levou Lula à presidência da República, as alianças nos Estados estiveram a reboque dos arranjos de cima.

Por isso, mesmo engasgada com as derrotas no plano municipal, a militância petista foi obrigada a engolir e apoiar a ascensão estadual da Guerreira, apelido criado pelo marketing de Wilma nos anos 1980 e que se popularizou entre seus eleitores. A partir daí, o pragmatismo vira um mantra nas campanhas do PT potiguar. De adversárias, Fátima e Wilma passaram a aliadas em razão das circunstâncias e voltaram a se enfrentar quatro anos atrás. O detalhe é que, mesmo em raias distintas, as duas travaram no mesmo período, a partir de 2000, uma luta particular para interiorizar suas marcas em todo o Estado.

Enquanto Wilma topou o desafio de enfrentar a toda poderosa oligarquia Alves na disputa para o Governo com o apoio do PT, incluindo uma vitória considerada improvável contra o atual senador Garibaldi Alves (MDB) que nunca havia perdido uma eleição, Fátima percorreu o Estado batendo de frente com famílias tradicionais que transformaram a Câmara Federal numa espécie de capitania hereditária das oligarquias locais e consolidou seu nome, no auge dos governos Lula e com a Educação como carro-chefe, como a mais importante e eficiente deputada federal do Rio Grande do Norte. A petista chegou a receber, em 2010, 220.355 votos, a maior votação já registrada no Estado para deputada federal e a quinta maior do país, proporcionalmente.

Mesmo ausente, de certa forma Wilma está presente na campanha. A agência Saiba Mais conversou com wilmistas que acompanharam e deram suporte à trajetória vitoriosa da ex-governadora no Estado. É unanimidade, especialmente entre os apoiadores da tropa de choque de Wilma, que a maioria dos eleitores da ex-governadora está caminhando ao lado de Fátima Bezerra.

O ex-deputado estadual Leonardo Arruda é um desses wilmistas e chama a atenção para a semelhança da espontaneidade dos eleitores nas campanhas de 2002, com Wilma, e na de 2018, com Fátima:

- Estou sentindo a campanha de Fátima como sentia o surgimento da candidatura Wilma em 2002. Ela surgiu como desafiante dos grupos tradicionais sem estrutura e, a partir daí, começou a espontaneidade do voto, passando por estruturas partidárias. Naquela época Wilma tinha dois ou três prefeitos e foi à luta até conquistar aquela vitória memorável. Passei uns 15 dias rodando vários municípios o interior, do oeste, e senti agora com Fátima a mesma espontaneidade que houve com Wilma em 2002.

Arruda destaca o apoio da prefeita de Triunfo Potiguar Lúcia Estevam, que anunciou apoio ao governador Robinson Faria, viu rejeição dos eleitores, tentou migrar para a campanha do candidato do PDT Carlos Eduardo, mas foi pressionada pelos moradores locais a se engajar na campanha da petista Fátima Bezerra.

- Ela fez um discurso dizendo que a exigência dos amigos e do eleitorado era por uma definição com Fátima para o Governo e Fernando Haddad para a presidência. Outros prefeitos também estão migrando.

Wilma, Leonardo Arruda e Fátima Bezerra

Com a morte de Wilma de Faria no ano passado em razão de um câncer no aparelho digestivo, Fátima Bezerra tem a oportunidade de consolidar seu nome na eleição para o Governo do Estado em 2018 como a principal liderança política do Rio Grande do Norte na atualidade. Com uma diferença. A petista acentua no próprio discurso que, se a vitória vier, será a primeira liderança de origem popular do RN.

Prefeito de Carnaubais por três mandatos, Luizinho Cavalcanti é mais um dos seguidores de Wilma que abraçou a eleição petista. Ele é um dos coordenadores da campanha de Fátima Bezerra no Vale do Açu e chama a atenção para o fato de que a ascensão da candidata do PT acontece no mesmo momento da derrocada das oligarquias do Estado.

- Essas oligarquias Alves, Maia e Rosado não tem mais nada ao oferecer ao Rio Grande do Norte. Veja pela dificuldade que Carlos Eduardo Alves está encontrando, mesmo com toda a estrutura, de chegar ao interior. Você vai ver o tsunami de votos que Fátima terá no interior do Estado.

Luizinho, como é conhecido, acredita que Wilma estaria engajada na campanha de Fátima se estivesse viva. E garante que maioria dos wilmistas do Estado, especialmente os que se colocam no campo de centro-esquerda, estão empenhados na campanha da candidata do PT.

- A maior parte (dos wilmistas) está com Fátima. Agora tinha muito wilmista de direita que, aliás, não sei nem se era wilmista. Acredito que se ela estivesse viva, estaria na campanha de Fátima sim.

O fato de serem mulheres, professoras e toparem o desafio de enfrentar oligarquias tradicionais do Estado não diminui as diferenças visíveis entre Fátima Bezerra e Wilma de Faria. A senadora e a ex-governadora vêm de berços diferentes. Enquanto Wilma surge na política como primeira dama do ex-governador biônico Lavoisier Maia no final da década de 1970, Fátima nasce do movimento sindical dos trabalhadores pela Educação.

Ex-prefeito de Macaíba e também considerado da tropa de choque do wilmismo, Luiz Gonzaga Soares, o Luizinho de Macaíba, também está apoiando a campanha petista. Ele rechaça o rótulo de inimizade que Wilma e Fátima chegaram a carregar em razão das disputas eleitorais:

- Inimigas não, adversárias sim. E muitas das pessoas que estavam ao lado de Wilma estão hoje com Fátima. As duas têm semelhanças. Semana passada conversei com várias pessoas de movimentos sociais sobre a aproximação das massas tanto de Fátima como de Wilma. As duas tinham e têm sensibilidade com as classes menos favorecidas. Wilma tinha e Fátima segue a mesma linha. Na época das enchentes do rio Jundiaí em Macaíba, por exemplo, Fátima ajudou muito trazendo recursos como deputada federal. Acho que tanto Wilma como Fátima trazem as pessoas para perto. A maioria dos wilmistas está acompanhando Fátima.

Ressentimento e respeito

É natural que eleitores imaginassem que o candidato Carlos Eduardo Alves (PDT), que ocupa do segundo lugar nas pesquisas, herdasse parte do espólio de Wilma. Afinal, a trajetória do ex-prefeito de Natal está ligada à ascensão de Wilma a partir dos anos 2000, quando ela deixa o município de Natal para se candidatar ao Governo do Estado. Porém, Alves é visto com ressentimento por alguns wilmistas e com respeito por outros.

O ex-prefeito de Carnaubais é uma liderança que ainda guarda mágoa do colega.

 - Ele é grosso, ingrato e só foi prefeito em Natal por causa de Wilma. Em qualquer outra cidade do Estado ele não se elegeria. Veja as dificuldades que ele está tendo. Carlos Eduardo foi prefeito de Natal, reeleito, voltou a ser prefeito tendo Wilma vice, mas quando não precisou mais dela, abandonou.

Respeito é o que prega a ex-assessora Magnólia Fonseca:

- Tenho o maior respeito tanto pelo ex-prefeito Carlos Eduardo, como pelo atual governador Robinson Faria. Deles eu só tive cordialidade e respeito. 

O ex-prefeito de Macaíba Luizinho Gonzaga desconversa:

- Dona Wilma aprendeu a não guardar rancor nem ressentimento.

Quem acompanhou de perto ou conhece histórias de bastidores das relações políticas da ex-governadora Wilma Faria não tem tanto certeza assim.

Amiga e ex-assessora de Wilma acredita em nova “surra de saia”

Wilma de Faria, eleitora e Magnólia Fonseca

Magnólia Fonseca tinha uma relação pessoal e profissional com Wilma de Faria. Era uma “wilmista” da cozinha, como se diz das pessoas mais próximas. A ex-governadora foi madrinha de casamento de Magnólia. As duas seguiram juntas tanto na prefeitura de Natal como nos dois mandatos no Governo do Estado. Na gestão municipal e estadual, Magnólia assumiu a função de relações públicas.

Sem a amiga e líder, Magnólia disse que não pensou duas vezes antes de embarcar no ousado projeto da candidata do PT Fátima Bezerra. E afirma que vê semelhanças entre as duas.

- Fátima estava numa situação cômoda e teve coragem de deixar tudo lá e partir para uma guerra desigual. E isso a gente aprendeu com Wilma, uma mulher de muita coragem. Não conheço no Rio Grande do Norte político que tenha tido tanta coragem como Wilma. Uma mulher que enfrentou, que lutou. Acho Fátima muito parecida nesse sentido. E se ela conseguir (vencer as eleições), será mais uma surra de saia.

A expressão “surra de saia” é uma referência à vitória das mulheres na política estadual. Magnólia destaca o papel de Fátima Bezerra no Senado e que, segundo ela, também fez valer seu apoio. E uso um rótulo bastante popularizado entre os eleitores de Wilma para reforçar o apoio à candidata petista.

- Acredito no trabalho de uma guerreira. Resolvi apoiar a senadora Fátima também porque acredito no trabalho que ela desempenhou no Senado, acredito em Fátima como mulher, uma pessoa que não tem sobrenome, que não veio de oligarquia e veio só.

Quando Wilma de Faria resistia ao câncer no sistema digestivo, Fátima foi visitar a ex-governadora no hospital. Magnólia presenciou o encontro e usa o episódio para responder a perguntar do repórter sobre a relação de inimizade que Wilma e Fátima tinham:

- Foram adversárias, mas nunca inimigas. Fátima sempre teve muito respeito em relação à governadora. Fui com ela fazer a visita, a ex-governadora já estava no hospital. Fátima tinha vencido a disputa para o Senado e ali no quarto ela falou, pediu sugestões, conversaram bastante e não havia nada.

Os encontros e desencontros de Fátima Bezerra e Wilma de

Faria 

Fátima Bezerra e Wilma de Faria: uma história de encontros e desencontros na política

Wilma de Faria (PSB) e Fatima Bezerra (PT) foram ao 2º turno em 1996 numa eleição histórica para a Prefeitura de Natal. Wilma participou do pleito com força própria, mas com apoio da oligarquia Maia (PFL) e venceu. Fátima tirou da disputa o candidato dos Alves (PMDB) do 2º turno, João Faustino (PSDB). Também concorreu, naquela eleição, o ex-deputado estadual Leonardo Arruda (PDT), que ficou em 5º lugar e apoiou a petista no 2º turno.

Em 2000, nova batalha, mas agora o Wilmismo era apoiado pelos Alves, que - dado o histórico da Prefeita - colocou um vice que julgavam incapaz de trair a família: Carlos Eduardo Alves (PMDB). Wilma venceu no 1º turno, devido à fraca candidatura da oligarquia Maia (PFL), que disputou com Sonali Rosado (PSDB). Fátima ficou em 2º lugar, tendo como vice Leonardo Arruda (PDT).

Em 2002, ocorre a primeira eleição em que o Wilmismo aparece como protagonista em nível estadual. É também a primeira aproximação de Wilma com o PT, que a apoia no 2º turno para o Executivo estadual, mas não compôs o Governo. Uma aliança formal só aconteceria em 2004, após apoiar Carlos Eduardo Alves (agora, no PSB) no 2º turno, o vice anti-traição que traiu a família.

A partir daí, o PT abre mão de protagonizar a política do Rio Grande do Norte em razão da prioridade no plano nacional com a eleição de Lula para a presidência da República. Em nível local, o partido virou linha auxiliar do Wilmismo, não tendo sequer candidatos majoritários na eleição de 2006, algo inédito desde 1982, primeira eleição do PT. O ano de 2006 é emblemático porque marca a união entre as famílias Alves e Maias, que perdura até hoje.

Em 2008, mais um capítulo: pressão do PT nacional faz Wilma abortar a candidatura a prefeito de seu pupilo Rogério Marinho (então, no PSB) para apoiar Fátima. Um acordo que envolvia os Alves, mas que não conseguiu envolver o povo.

Em 2010, novo apoio do PT a Wilma, concorrendo para o Senado e ja dando sinais de declínio. A ex-governadora perdeu.

Em 2012, Wilma concorreu como vice-prefeita de Carlos Eduardo Alves (agora, no PDT), seu antigo vice. O PT apoiou a chapa no 2º turno, contra o atual deputado estadual Hermano Moraes (MDB).

Em 2014, uma reorganização de forças, após fracasso de Rosalba Ciarline (DEM), coloca na mesma chapa Wilma, Alves e Maias. Neste pleito ocorre o último confronto entre as duas, com vitória de Fátima por 55% dos votos válidos.

Em 2016, Wilma elege-se vereadora pelo PTdoB depois de ser destronada pelo PSB nacional, partido que liderou no RN por mais de 20 anos. Sequer foi mantida como vice de Carlos Eduardo Alves em sua reeleição.

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